Lambe-lambe digitalizado

Por Aprígio Vilanova

Foto: Aprigio Vilanova

Foto: Aprigio Vilanova

Rosalvo Brás de Oliveira, maceioense, 58 anos de idade, começou a trabalhar com os retratos lambe-lambe, na Praça dos Palmares, no centro de Maceió, na década de 70. Aprendeu com seu irmão que era fotógrafo de rua e que lhe ensinou os primeiros passos. Da compra de sua primeira câmera, em 1970, aos dias atuais, já se passaram 42 anos de dedicação ao oficio de retratar pessoas. Na maior parte do tempo com a técnica tradicional dos “Lambe-lambes” que nos remete ao século XIX, ao inicio da fotografia.

O aparato tecnológico próprio do século XXI (câmeras digitais, smartphones, tablets) ainda não foi suficiente para aposentar os fotógrafos “Lambe-lambes”, mas de transformá-los em “Lambe-lambes” digitais, como é o caso de seu Rosalvo. Ele já se rendeu à praticidade da tecnologia digital e usa a máquina lambe-lambe para demarcar território e atrair a clientela que hoje é pouca, mas ainda garante a sua sobrevivência.

Aprigio Vilanova – Há quanto tempo o senhor trabalha como ‘Lambe-lambe’?

Rosalvo Brás de Oliveira – Comecei aos dezesseis anos, primeiro no mercado público de Maceió e logo em seguida vim para essa praça, e de lá pra cá já vi muitas mudanças, hoje estou com cinquenta e oito então já são quarenta e dois anos nessa labuta.

AV – E como o senhor começou?

RBO – Comecei garoto ainda, naquele tempo a vida era difícil e tive que trabalhar. Meu irmão era fotógrafo de rua e me ensinou um pouco a técnica da fotografia. Tive a ajuda de algumas pessoas e com um trocado que consegui juntar comprei a primeira máquina, e já se passaram quarenta e dois anos.

AV – Como era quando o senhor começou?

Era muito diferente. Para você ter ideia quando cheguei aqui nesta praça em 1971, tinha mais dois Lambe-lambes, mas já chegou a ter quinze retratistas. Nessa época a gente chegava a fazer 15 retratos por dia e era para todo tipo de documento.

AV – E como é hoje?

É difícil, caiu demais a procura. É que a maioria das fotos para a documentação é tirada no próprio órgão, antes não. Tirava foto para o cartão do INSS, para carteira de identidade, de motorista, para o título eleitoral, para carteira profissional, para matricula escolar. Hoje em dia só se tira foto para a reservista e para o alistamento militar, nem mais para matricula a gente é procurado. Hoje, num dia com bom movimento, eu faço cinco fotografias.

AV – E o senhor já pensou em desistir?

RBO – No dia que as fotos para reservista e para o alistamento forem feitas lá, eu desisto do ramo.

AV – E o senhor consegue sobreviver só da fotografia?

RBO – Já criei a família com esse trabalho, hoje já estão tudo (sic)criados o que ganho é só para mim, então dá para sobreviver. Mas de qualquer maneira ainda pinga (aparece cliente) não como era antes e consigo me manter.

AV – E o senhor ainda usa a câmera tradicional?

RBO – Não, ela fica ali para atrair os fregueses. Hoje trabalho com a câmera digital, ela fica por trás da lambe-lambe, e com uma impressora. Eu bato e revelo na impressora, três minutos para ficar pronta.

AV – Com qual tecnologia o senhor prefere trabalhar?

RBO – Com a digital dez vezes, é mais prático, mais rápido e a qualidade da foto é melhor. Na lambe-lambe não tinha a qualidade que a digital tem e eu demorava quinze minutos para revelar o retrato. Apesar de o lucro ser menor com a digital, eu prefiro trabalhar com ela, com a lambe-lambe eu cobrava R$ 3,00 e tinha um lucro de 90%, já com a digital eu cobro R$ 6,00 e tenho 50% de lucro. A digital é mais rápida e a qualidade é maior.

AV – E o senhor sente saudades da época áurea dos Lambe-lambes?

RBO – Não tenho por causa da praticidade da digital que falei. Antes eu fazia tudo, as vezes não tinha os produtos químicos necessários, aí eu tinha que viajar ao Recife. E eram muitos produtos químicos utilizados, era muito trabalho. Hoje, quando compro o material para a digital já vem tudo, o cartucho e o papel.

AV – E por que “Lambe-lambe”?

RBO – Não é do meu tempo, mas os mais antigos falam que quando tirava a foto eles lambiam para terem a certeza que era o lado certo do papel e que a qualidade da revelação e da fixação estava boa.

Os “Lambe-lambes” foram profissionais que ocuparam (em algumas regiões ainda ocupam) os espaços públicos das cidades brasileiras a partir do século XIX e que tiveram papel importante na popularização da fotografia no Brasil. Eles são chamados assim no Brasil devido ao fato de lamberem o papel em que seria revelada a fotografia para se certificarem que a impressão sairia boa. De tanto observarem o trabalho destes retratistas a população passou a chamá-los de Lambe-lambes, em um tom carinhoso, que acabou permanecendo no imaginário e no vocabulário dos brasileiros.