A atriz do caminho inverso

Por: Renatta de Castro

Grazi em cena na peça A Verdadeira História da Cinderela. (Aquivo Pessoal)

Grazi em cena na peça A Verdadeira História da Cinderela. (Aquivo Pessoal)

A primeira vez que vi Grazielly Ribas de Oliveira, ela era uma prostituta que declamava nas palavras de Chico Buarque: “Se acaso me quiseres, sou dessas mulheres que só dizem sim”. Pouco mais de seis meses depois, nos reencontrávamos, mas agora ela era uma gata fugindo de seus donos porque não aguentava mais viver presa e queria ser livre como todos os gatos devem ser. E como essa gata, Grazi Cascon (seu nome artístico) , veio do Rio de Janeiro para Teófilo Otoni com apenas 14 anos para seguir os seus sonhos. Hoje, eu de volta a minha cidade natal, peço para conversar com ela sobre essa mudança e seus resultados.

Renatta de Castro: Como você decidiu que queria seguir a carreira de atriz?

Grazi Cascon: Era um sonho de infância, eu nem lembro como começou, eu só sabia que queria aparecer na TV, sabe? Queria aparecer na Malhação, ser famosa, essas coisas. Mas meus sonhos mudaram quando eu comecei a fazer teatro, a sensação de proximidade que há entre o ator e o público, a troca, é isso que faz valer a pena mesmo. Além de que há a possibilidade de ser alguém diferente sempre, de mudar completamente de personalidade, é muito divertido e desafiador.

RC: De onde surgiu a decisão de mudar do Rio para Teófilo Otoni?

GC: Eu vivia com a minha mãe no Rio de Janeiro desde que tinha 3 anos, mas nasci em Teófilo Otoni e meu pai ainda morava aqui. Sempre tive o sonho de ser atriz e no Rio a concorrência é muito maior. Para entrar em alguma companhia de teatro, sempre exigiam uma experiencia que eu não tinha devido a falta de oportunidades da cidade grande, então, como eu conhecia alguma companhias de Teófilo Otoni decidi fazer o caminho inverso da maioria, e vim para uma cidade pequena viver com a minha família minera e seguir o meu sonho de ser uma atriz notável.

RC: Que resultados esse caminho inverso teve para você?

GC: Deu muito certo. Eu conheci o trabalho do Grupo In-Cena de Teatro quando cheguei aqui, e além de ser uma companhia de teatro, eles também são uma escola, comecei, então, a ter aulas. Primeiro queriam me matricular na turma dos adolescentes, mas eu sempre me considerei muito madura para a minha idade, então relutei até que me matricularam com os adultos. E logo fizemos nossa primeira apresentação com uma peça baseada nas obra de Chico Buarque, “Mulheres de Quinta ou de Chico”, lembro-me que foi muito polêmico na época porque a minha avó ia me ver, e eu fazia o papel de uma prostituta, o meu diretor até pensou em cancelar o meu papel no espetáculo, mas eu engoli a vergonha e fiz, foi um pouco constrangedor no inicio, mas logo me soltei, foi quando eu tive a certeza de que eu tava fazendo o que eu sempre quis. Daí para frente eu participei de várias peças e inclusive me tornei uma das produtoras do In-Cena.

RC: E como surgiu a chance de virar uma produtora de teatro?

GC: foi mais ou menos uns 2 anos atrás, o In-Cena estava montando um espetáculo original, chamado “Em Algum Lugar”, e ia ser uma peça maior e mais trabalhosa, a gente tinha sido convidado para apresentá-la em Belo Horizonte, iam precisar de mais produtores. Então, eu demonstrei o interesse de ajudar. Desde lá já produzi quase 10 peças e tem sido muito gratificante porque eu estou vendo o In-Cena crescer e eu estou crescendo junto. Recentemente a gente ganhou 9 prêmios no Festival de Artes Cênicas de Conselheiro Lafaiete, com “Os Saltimbancos” e “Em Algum Lugar”, e isso em um lugar como Teófilo Otoni, que só começou a investir mesmo em cultura recentemente.

RC: Além da Companhia de Teatro, o In-Cena também começou a oferecer outros serviços para a cidade, me conta um pouco sobre eles.

GC: O In-Cena começou como uma escola e o grupo, mas ele vem se desdobrando. Além de oferecer aulas para turmas que vão do infantil ao adulto, o grupo tem um espaço cultural, onde funciona um bar mais alternativo e nós realizamos alguns eventos semanalmente, como festas, sarais, shows que vão do forró a música erudita. E nós também produz alguns eventos para a cidade mesmo, para tentar levar um pouco de cultura. Recentemente, montamos uma comédia em praça pública sobre diversidade, e foi muito bom, porque conseguimos levar para o público problemas que ocorriam no nosso cotidiano de uma forma fácil e leve. Nós também produzimos o FESTO, que foi o primeiro grande Festival de Teatro em Teófilo Otoni, e que teve uma aceitação muito boa.

RC: Você disse que fez recentemente uma comédia, o que você prefere, atuar em comédia ou dramas?

GC: Olha, eu sou muito dramática, sempre fui. No drama eu consigo sentir mais o personagem, eu sofro junto, eu passo pelo o que ele passa. Mas as minhas experiências com comédia também são muito boas, fiz uma peça chamada “Esse Lugar Chamado Brasil”, que era uma comédia dramática e foi muito bom poder conciliar os dois, poder rir do problema ao invés de sofrer com ele. Eu também gostei muito de fazer ” A Verdadeira História da Cinderela” que é um comédia infantil, fazer teatro para crianças é incrível porque a reação delas é muito espontânea.

 RC: E a partir de agora, o que você vê para o seu futuro?

GC: Quando eu vim para Teófilo Otoni, a intenção era adquirir experiência aqui, para então voltar para o Rio e me consagrar lá, mas hoje eu já não sei mais se é isso que eu quero para mim. Minha intenção é fazer uma faculdade de artes cênicas, aqui em Minas mesmo, e depois seguir a vida no teatro, talvez um dia criar minha própria companhia. Seria ótimo virar uma atriz da novela das oito, ou trabalhar em Hollywood, mas não tenho mais essas ilusões, agora, o importante mesmo para mim, é viver do que eu amo fazer, independente da fama que isso vai me proporcionar.

Me despeço então de Grazi, que teve mais uma vez que fazer o caminho e inverso, e abandonar o teatro para ser uma atriz melhor. Ela está estudando para o vestibular de artes cênicas, e para ter mais tempo teve que sair do In-Cena. Desejo então a ela boa sorte em sua caminhada, e deixo-a seguindo a sua vida.