“Você não tem que esperar o leitor chegar à biblioteca, você tem que sair com os livros”

Por Katiuscia Neves, Laurence Henrique e Luana Carvalho

Foto: Arquivo pessoal.

Incentivar a leitura e inserir livros dentro do ambiente familiar é o objetivo do projeto de Andreia Donadon Leal, denominado Poesia Viva Bate à Sua Porta. Criado em 2009 na histórica cidade mineira de Mariana, o projeto começou de modo totalmente informal. Quando casou-se com o também escritor José Benedito Donadon-Leal, decidiu doar os livros que estavam duplicados em sua biblioteca: “Achei estranho porque sempre tive a ideia de entregar livros para as universidades e bibliotecas universitárias”, salienta José Donadon. Logo após, o projeto tomou forma e Andreia passou a distribuir livros de sua própria autoria e de outros autores às pessoas da vizinhança.

“Livro fechado é menos um leitor, eu acho que o livro tem que circular”.

Andreia é licenciada em Letras pela Universidade Federal de Ouro Preto (UFOP), pós-graduada em Artes Visuais e Cultura pela Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais (PUC-MG) e mestre em Estudos Literários pela Universidade Federal de Viçosa (UFV). Além de escritora, Andreia é artista plástica.

Pioneiro no Brasil, o nome do projeto faz referência à proposta literária Aldravista (bate à porta), originado da aldrava, peça muito utilizada no século 18, fixada na porta de entrada das casas e usada como batedor. O Aldravismo foi criado por Andreia e por outros poetas de Mariana no ano de 2000. A modalidade trabalha com instinto de liberdade e com todas as formas de poesia. Sendo assim, estabelece uma convivência harmoniosa entre os diversos tipos de livros. É um estilo que trabalha com o mínimo de palavras e o máximo de poesia para transmitir a mensagem. É estruturado em seis versos univocabulares (um vocábulo em cada linha) sem a exigência de rimas. Trata-se de uma modalidade simples, porém complexa, pois cada leitor terá de refletir acerca do poema, compreender e complementar, diferentemente do romance. Andreia resume a Aldravia como a “consagração da forma poética brasileira”. Sua criação já foi exportada para outros países, como Portugal e Espanha.

É de porta em porta que Andreia abre o caminho à leitura. Para ela todas as pessoas são leitores em potencial, inclusive aqueles que não sabem ler. A ideia do projeto é simples: para que haja leitura, o livro tem de sair da biblioteca e chegar aonde o povo está. “É um trabalho de formiguinha, se eu conseguir atingir 5% já é um resultado bom”, acrescenta.

Dona Socorro se encantou tanto com o Poesia Viva, que hoje distribui livros com Andreia. / Foto: Laurence Henrique.

A maior dificuldade que Andreia enfrenta com seu projeto é a resistência. Ela relata que já visitou casas em que os moradores se recusaram a receber os kits, formado por seis livros. Ainda segundo ela há a proverbial desconfiança mineira, como de quanto custaria o livro. Porém este não foi o caso da dona de casa Maria do Socorro Anjo das Dores, de 62 anos, que através do Poesia Viva acabou adquirindo maior afeição pela leitura. “Tudo que ela escreve é muito profundo, há uma essência, a gente vê que aquilo sai do fundo da alma”, diz sobre Deia, forma carinhosa como chama Andreia Leal. Dona Socorro tomou tanto gosto pelo projeto que começou a acompanhar a distribuição de livros e se emociona, dizendo que cresceu intelectualmente desde que começou a gostar de leitura.

 Desde 2009, o projeto já distribuiu 31 mil exemplares, de 51 titulos diferentes.

O projeto venceu o Prêmio Viva Leitura 2009, iniciativa dos ministérios da Educação e Cultura. Com a premiação, Andreia conseguiu publicar mais obras, a ação ganhou força e se expandiu para outros municípios. Depois que projeto cresceu e obteve mais credibilidade, a prefeitura de Mariana ofereceu ajuda à Andreia, que aceitou com o objetivo de estender o projeto. Além de Mariana, participam do projeto as cidades de Ouro Preto, Santa Bárbara, Ipatinga, São Gonçalo, Itabira e Sabará, no estado de Minas Gerais, e as cidades de São Paulo e Rio de Janeiro.

Foto: Arquivo pessoal.

Conheça o trabalho da poesia Aldravista, desenvolvida por Andreia Donadon Leal. Os versos foram retiradas da obra “O livro II das Aldravias”. O livro faz parte da coletânea entregue aos leitores através do Poesia Viva:

além

das

estrelas

meu

pai

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mãe

na

janela

à

minha

espera

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Mariana

tricentenária

mortas

alegrias

amargam

histórias

Edição Final: Katiuscia Neves

Reportagem: Luana Carvalho e Laurence Henrique.

Imagens: Laurence Henrique.