De muito longe de casa

Como a UFOP abriga os estudantes que vêm de regiões distantes dos Inconfidentes

Texto: Gabriel Campbell, Júlia Cabral, e Rafaella Rocha                                                                             Imagens: Júlia Cabral

Leia esta matéria ao som de Tulipa Ruiz part. Lulu Santos, “Dois cafés”

Há muitas escolhas a se fazer quando um estudante decide ingressar em uma universidade. O curso, o transporte, a alimentação; tudo com o melhor custo-benefício. Mas as escolhas se multiplicam e se tornam muito mais difíceis quando o curso e a universidade almejados estão em outro estado ou até mesmo em outra região do país. Longe da família, dos amigos e do conforto de uma cidade conhecida como “a palma da mão”, o jovem calouro é obrigado a se transformar para se adaptar imediatamente aos novos ambientes que frequentará pelos próximos quatro ou mais anos. Segundo dados cedidos pela Pró-Reitoria de Graduação (Prograd), nos últimos três anos, desde que a universidade aderiu ao SISU (Sistema de Seleção Unificada), a UFOP recebeu calouros de 23 dos 26 estados do país, excluindo-se dessa análise o estado de Minas Gerais.

No infográfico a seguir, é possível ver os números de alunos matriculados da UFOP desde 2011, além dos alunos em geral (já matriculados e ingressantes pelo ENEM) que desistiram da universidade a partir deste período.

Tem que correr, tem que se adaptar!

Amanda Bona, 20 anos, paraense, estudante do curso de Engenharia de Minas, escolheu a Universidade Federal de Ouro Preto pela tradição do curso e pela infraestrutura dos laboratórios. “O curso de Engenharia de Minas até existe no Pará, mas lá não é instituto, é faculdade. Há menos laboratórios, menos infraestrutura”, comenta. Quando optou vir para Minas, a estudante pesquisou sobre a cidade que até então era desconhecida por ela. Quando perguntada se toda a cultura de Ouro Preto contribuiu para que ela permanecesse, Amanda diz que se não estivesse nessa cidade de “beleza única e apaixonante”, cercada por pessoas maravilhosas, seu sonho de ser engenheira de minas sofreria alterações. Ela ratifica sua resposta, afirmando que nunca pensou em desistir. “A oportunidade de estar aqui é única. Não abriria mão de um presente do destino assim tão facilmente”. Amanda diz que hoje vive bem, mas que sente saudades de casa. “Às vezes depois de uma semana de provas, o que eu mais queria é passar o final de semana em casa, mas não posso e isso acaba saturando”, desabafa.

Seus pais sempre a apoiaram em tudo que era relacionado aos seus estudos e dessa vez não foi diferente. Sua mãe até tentou fazê-la mudar de ideia, mas ficou muito orgulhosa de, apesar da distância, Amanda ainda estar disposta a concluir o curso que almejava. “Quando ela viu que eu estava conseguindo, percebeu que também conseguiria conviver com a saudade”, conta. A estudante ia para casa a cada seis meses mas, atualmente, só viaja quando coincidem as promoções de passagens aéreas com o período de férias.

“A oportunidade de estar aqui é única. Não abriria mão de um presente do destino assim tão facilmente”.  (Amanda Bona)

A estudante de Letras Bárbara Maria Barbosa, 24 anos, é nascida na Bahia, mas vinda de Recife para Minas. Já está na UFOP há três anos e garante que nunca pensou em desistir da universidade. Apesar de ter saído da casa dos pais aos 18 anos, a jovem ainda convivia com a família, pois morava na mesma cidade, em Recife. Hoje, Bárbara também depende das promoções de companhias aéreas para visitar família e amigos, por vezes perdendo datas comemorativas como o Natal. Apesar disso, teve, desde o princípio, o apoio dos pais que, até pela distância, nunca puderam visitá-la na nova casa.

                      Bárbara veio de Recife, mas não pretende desistir de seu curso

 A estudante sempre quis morar em um lugar distante, mesmo não conhecendo Ouro Preto. “Depois que eu cheguei aqui eu acabei me encantando por outras coisas, mas o motivo (de escolher a UFOP) foi o SISU”, ela afirma. Além disso, um fator que a ajudou a se adaptar à cidade foi a república que a acolheu como uma família. Ainda assim, diz que a mudança foi impactante. “Existe essa questão de aprender a lidar com a coletividade (em repúblicas) e a região de Ouro Preto e Mariana é muito ligada à tradição, coisa que  Recife também é, mas que se lida de uma forma bem diferente.

“Eu vim de uma cidade relativamente grande e depois que cheguei aqui eu fiquei completamente perdida”, explica. Apesar da distância e do choque cultural, Bárbara não quer voltar, porque deseja concluir o seu curso. Gosta de Mariana, cidade em que vive agora, e acredita que o Recife “vai se tornar um lugar complicado de se morar em breve”. Também afirma que a própria universidade é um motivo: “comparando meu curso da UFOP com o da UFPE, acho que aqui há mais oportunidade de conseguir o que se quer dentro da universidade: iniciação científica, bolsas e assistência estudantil”. Além de tudo, mesmo depois de formada pretende continuar pela região Sudeste ou, no máximo, Brasília.

Bárbara conta que conheceu, em sua trajetória universitária em Ouro Preto, muitos alunos que, como ela, vieram de outros estados e até da sua cidade. “É até engraçado, por eu ser de Recife, as pessoas acham que tenho que conhecer todo mundo que veio de lá. Então acaba que você conhece muita gente que é de longe, especialmente os alunos que vêm do Nordeste”. Comenta também que conheceu muitos alunos que desistiram da universidade pela distância, apesar da assistência prestada pela UFOP.

Assistência na Universidade

O projeto “Longe de Casa” é coordenado pela Pró-Reitoria de Assuntos Comunitários e Estudantis (PRACE) e pelo Núcleo de Assuntos Comunitários e Estudantis (NACE) da UFOP. As atividades são desenvolvidas em Mariana, onde existem dois campi da universidade. O objetivo do projeto é oferecer um espaço de socialização para os alunos da UFOP que passam por dificuldade de adaptação ao ambiente universitário. São encontros em grupo para que os estudantes, de todos os cursos da universidade, possam refletir sobre essa nova experiência, as dificuldades e as vivências comuns.

                                                                    Adaptação dos calouros é pauta importante na universidade

Leandro Andrade Henriques, psicólogo do NACE da UFOP, fala sobre o funcionamento do “Longe de Casa” e surpreende ao dizer que o projeto recebe mais alunos da região do que de cidades muito distantes. “O intuito é mostrar que aqui é possível criar novos vínculos e dessa forma facilitar a adaptação ao novo ambiente”, afirma Leandro. A divulgação é feita no site da UFOP e no evento “Bem vindo ao calouro”,  a fim de atingir o público-alvo do projeto.

“O intuito é mostrar que aqui é possível criar novos vínculos e com esses novos vínculos facilitar a adaptação ao novo ambiente”.  (Leandro Andrade Henriques)