Candonguêros comemora 5 anos de existência

Por Wendell Soares

De tarde, famílias com crianças, fantasiadas de pierrôs e colombinas, dançando ao som das clássicas marchinhas de Carnaval. À noite, cerca de 4 mil pessoas acompanhando espetáculos cênicos e musicais, ancorados por sambas tradicionais, composições de cidadãos ouropretanos, congado, maracatu e bonecos no palco. Poderia ser o relato de um carnaval dos anos 60, mas é a realidade dos cinco dias de folia, na última metade da década, do projeto Candonguêro: era uma vez um carnaval, que colore de confetes e nostalgia o Largo da Alegria, no centro de Ouro Preto.

Se a cidade, famosa por seu patrimônio histórico, pode hoje contar novos enredos, com absoluta certeza, o contexto humano e musical permanece intacto nos olhos do grupo. Surgido em 2008, com a intenção de “resgatar a tradição dos antigos bailes de Carnaval”, o grupo Candonguêros hoje é parte fundamental da história de Ouro Preto. Dividindo o espaço com as micaretas universitárias – que atraem mais de 30 mil pessoas por dia, segundo dados da Skol, patrocinadora do último carnaval – o Candonguêros tem um modesto e fiel público, dentre turistas de várias partes do mundo à moradores da cidade que sentem-se representados pelo grupo.

Ao lado de sambas imortalizados por Noel Rosa, Tom Jobim, Clara Nunes, dentre outros, alguns compositores locais são lembrados por canções que fizeram história nos bailes de rua da cidade, assim como no findo desfile das escolas de samba de Ouro Preto. “É uma coisa que nós, ouropretanos, não podemos deixar acabar nunca: esse carnaval tradicional com as verdadeiras músicas. As crianças rezam para não chover e não atrapalhar a diversão delas.”, ressaltou Célia da Silva Rodrigues, 44 anos, que levou a mãe e os filhos de 5 e 8 anos para pular carnaval no Largo.

O PROJETO

Um dos idealizadores do Candonguêro, o diretor cênico Flaviano Souza, lembra que a iniciativa surgiu após enxergarem uma globalização midiática do carnaval, culminando nas principais atrações do ano de 2013, patrocinadas (e questionadas) por uma grande cervejaria, em artistas populares e sem associação com as músicas tradicionais da festa. “Nossas raízes riquíssimas estavam se perdendo”, acrescentou Flaviano. “Um trabalho de resgate foi feito em especial com os principais compositores ainda vivos do antigo carnaval ouropretano. São eles, dentre outros, Vandico, Vicente Gomes, Jorge Adílio, Bené da FlautaEdmundo Guedes, Seu Walter,  Maria do Morro e João do Pandeiro.” completa Flaviano.

Importante lembrar que estes sambistas, não só são homenageados, como alguns deles, sobem ao palco no último dia do Carnaval, dividindo a atenção dos foliões com a banda. Ao longo do ano, o Instituto Candonguêros atua como uma associação sem fins lucrativos, e funciona como escola de música, cultura e idiomas.

Pela primeira vez nestes cinco anos, o grupo marcou uma apresentação fora do carnaval, com a intenção de comemorar o projeto. “Sempre estivemos perto do público, e a possibilidade de um show fora de época era um pedido comum”, reitera Chiquinho de Assis, um dos fundadores do grupo e atual vereador da cidade. Com o nome de “O clamor do samba”, Chiquinho ressalta que a inserção do grupo no contexto amplo do Carnaval não foi feito de maneira tão fácil, mas que os frutos colhidos com a receptividade do público, dá a eles a possibilidade de repetir o sucesso dos dias de folia.

A HISTÓRIA

Inspirado nos famosos táxis de Luanda,o nome Candonguêros também remete a um instrumento de percussão das rodas de jongo, posteriormente utilizado no samba. “Precisávamos de uma sugestão que, ao mesmo tempo que representasse a pluralidade do nosso povo, fosse universal. E a associação da história ouropretana com os negros, a África e as raízes da música brasileira nos deram este presente” conclui Chiquinho, ao afirmar que não se lembra de quem foi a ideia do nome.”Na verdade, foram todos fundadores” desconversa, ao frisar que não há um líder.

O PÚBLICO

Cecília Mariano, natural de Jaboticatubas é outra que reforça o público heterogêneo do grupo.”Não tive o privilégio de nascer em Ouro Preto mas já estou me achando ouropretana e candonguêra” brinca a professora, que já acompanha o grupo desde o carnaval do ano passado. Pra Ludmilla Guimarães,estudante de arquitetura e natural de Ouro Preto,a folia do grupo se destaca por não fazer distinção de público, e abranger de crianças a idosos. Já Fabiana Gonçalves, analista de comunicação e marketing na cidade de Ouro Branco, lembra que veio a primeira vez por recomendação de amigos, e que a possibilidade de fugir do funk, axé e outros estilos que não a interessam, foi o que a levou ao show. Mas que percebeu que era muito mais do que isto: “É um alívio para os ouvidos e alma ver a admiração e sorriso de cada um presente ali.” completa. ”Ouro Preto é um pedaço do mundo, e um pedaço que sabe da sua importância.”, finaliza Chiquinho de Assis, exibindo um orgulhoso sorriso ao falar de sua cidade.

O SHOW

Com um atraso de 45 minutos, Chiquinho de Assis e o Candonguêros adentrou o palco do centro de Convenções da Ufop com Chega de saudade, de João Gilberto. Mineiramente agradeceu o público, comentou sobre a noite fria e recordou o fato de ver vários rostos conhecidos pela banda: “o Largo da Alegria, hoje é aqui”. Com um repertório com poucas variações (a maior surpresa foi o set dedicado ao rock nacional e a Jorge Benjor), nas mais de 4 horas de apresentação ficou uma única certeza:eles já são maiores que o carnaval da cidade. E até os sambas menos conhecidos, ganham em grandiosidade, quando executados com a paixão e encanto que o grupo exerce nos ouvintes