O Cortejo no Circovolante

Por Ana Clara Fonseca e Catarina Barbosa

O cortejo “Samba no Pé de Moleque” é um espetáculo circense-musical do Circovolante e visa à união do público com a música e as artes circenses. O repertório é composto por canções de domínio público, usualmente cirandas. Há músicos, malabaristas e palhaços. Estivemos no local no dia 20 de Junho e entrevistamos os palhaços Xisto Siman e João Pinheiro, com o intuito de saber sobre o cortejo  e um pouco sobre 5º Encontro Internacional de Palhaços, também realizado pelo Circovolante , que acontecerá do dia 19 a 22 de Setembro desse ano.

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Foto: Catarina Barbosa

Como surgiu a ideia de trabalhar o circo junto a um cortejo musical?

João – Não chega a ser uma ideia original. A gente já teve trabalhos anteriores que tinham essa característica. O que difere esse cortejo de outros que fizemos no passado e de muitos outros que conheço é a clareza do que se quer. Por exemplo, a gente usa uma proposta, trabalhando com músicos profissionais. Tem repertório musical, tem trajeto e o cortejo funciona como um show. Não é apenas um cortejo, ele tem todo um roteiro, uma proposta de início, meio e fim.

Xisto – A ideia é pegar música popular que a gente toca, música de circo, música de samba tradicionais, cirandas, músicas do congado, do imaginário popular mineiro. A gente condensa isso em um espetáculo. Não é só um cortejo em si, tem princípio meio e fim e tem toda uma sequencia montada pra trabalhar o ritmo das pessoas que estão vindo com a gente, em que todo mundo é incitado a dançar. E permeado a isso, vem os malabares, a perna de pau.

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João Pinheiro (esquerda) e Xisto Siman (direita). Foto: Catarina Barbosa.

E como são feitas as escolhas desse repertório?

J- Ele varia muito, na verdade. A gente ficou alguns anos com uma base de repertório firmada e, por exemplo, esse ano a gente resolveu dar uma modificada maior. O repertório é muito rico, às vezes, o Xisto compõe uma música, eu componho uma música. Às vezes eu gosto de uma música que eu curtia desde criança ou que eu vejo na internet mesmo e aí incluímos. Mas o que há de coerência é que buscamos uma sonoridade e um tipo de música que, na verdade, se mistura com o espetáculo. O importante é isso, é que haja uma unidade, que a música contribua para que o espetáculo tenha a nossa cara.

T- E vocês têm alguma influência na escolha dessas músicas?

X- No princípio, 13 anos atrás, com o cortejo nesse formato, começamos com muita música de raiz do Brasil inteiro, músicas das festas religiosas, músicas das quadrilhas, músicas de terreiro de macumba, música de várias partes do Brasil. Então optamos, no princípio, por músicas de raiz. Aí depois a gente colocou música de circo. E aí a coisa foi dando uma guinada, porque a gente já tinha cirandas e compusemos cirandas para o cortejo. Então, acabou que a escolha foi essa: pegar músicas que já estavam no imaginário popular e incluir música que a gente compõe. Seis composições do João, uma do Paulinho, duas/três minhas. Então, é baseado nessa coisa primeira de cortejo, que é puxar as pessoas para tocarem com a gente na rua e a gente juntou composições nossas que tinham a ver com esse universo popular, religioso, da ciranda, do circo e do samba.

J- Naturalmente, a gente escolhe aquilo que tem a ver com o universo Samba no Pé De Moleque. Mas antes de tudo, é música popular.

T- Você falou em puxar o público para o meio da rua. Como vocês conseguem influenciar o público a entrar na ciranda?

X- Hoje, o universo do cortejo musicalmente é muito rico: ele tem três sopros, um violão, quatro percursionistas, duas pessoas cantando. Então isso atrai as pessoas para aquele lugar ao redor do carrinho. E a música em si, a música que a gente toca, já vai fazendo essas pessoas entrarem. As pessoas entram na jogada. Então, no final, na hora da ciranda, o povo já está embarcado. Na hora que a gente chama, o povo embarca. É bem tranquilo isso.

J- Acho que tem a música e tem a rua, bem direto ali, a gente com pouca maquiagem ou sem nenhuma pra tocar no cortejo. Sempre firmamos por estabelecer um diálogo que não tivesse nenhum tipo de barreira. No espetáculo inteiro, construímos isso. Construímos a percepção: você não é um assistente, você participa do espetáculo. A gente tira o público que fica normalmente na posição de quem assiste e o coloca dentro do espetáculo. Então, convidar pra ir pra uma roda é o mesmo que convidar a repetir com um trecho de ciranda.

X- Tem a banda e a gente vai puxando. É isso que o João tá falando. A nossa formação é de rua, a gente sempre como palhaço, com um espetáculo sempre olhando muito pro povo, e com o cortejo também. A gente começa, já convida, vai cantando um pro outro, aí os músicos com o publico, a gente com o público, então, ao final do cortejo acho que todo mundo embarca, nunca não embarcaram.

J- É, então a gente tá ai até hoje.

X- Por enquanto, a gente tá ai até hoje.

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Carrinho utilizado no cortejo “Samba no Pé de Moleque”. Foto: Catarina Barbosa.

T- Como surgiu o nome “Samba no Pé de Moleque”?

J e X- No pé de moleque! No pé de moleque daqui.

J- É porque a gente propunha, com o pé de moleque fazer um…um…

X- Sambão! (risadas)

J- É, porque na verdade, não é só samba, mas toca samba. A ideia é juntar isso tudo, a fidelidade do chão, a música mais popular brasileira possível, ou seja, o samba.

T- Xisto, no cortejo, qual o período de apresentações de vocês?

X- Todo trabalho nosso temos uma produção, porque é muito trabalho, muito ensaio, muita gente envolvida. Então mandamos projetos, da profissão, começamos a vender para prefeitura, e a partir do momento que as pessoas nos contratarem, fazemos esse trabalho. Esse ano fizemos 15 encontros, só com sopro, depois juntou as cordas, nossa voz, e por último a percussão. Todo o trabalho da elaboração do cortejo, do que já existia e do que agora fazemos, espetáculos são feitos a partir das apresentações.

T- Fugindo então um pouco do assunto, sobre o Circovolante, 5o. Encontro Internacional de Palhaços, vai ter esse ano?

X- Sim, em Setembro. Do dia 19 a 22 de Setembro. Acabamos de lançar o edital, no Facebook, internet, para receber material. Foram mais de 30 espetáculos argentinos. Fomos na Argentina, numa feira de arte e recebemos muito material. Desde o início do ano estamos recebendo material informalmente, e agora porque abriu o edital. Encerramos a captação de recursos e os recursos captados serão feitos nesse formato, esse ano. O Encontro Internacional de Palhaços ele é na verdade, ininterrupto. Quando acabamos o encontro, prestamos conta deste e já temos que começar a pensar o próximo. Para fazer esse projeto, temos que estudar o formato, como faremos o ano que vem, será que esse que funcionou vai funcionar da mesma forma no próximo. Não só aqui, mas toda a pré-produção é gigantesca. O evento em si é relativamente pequeno diante de todo esse trabalho de pré-produção que nós temos. Tem um grupo do Japão que tentamos trazer há 5 anos. Estamos entrando em contato pra ver, se não puderem vir agora, para vir no ano que vem. São pessoas que nunca tem agenda. Não tem essa de “ah, agora vou começar”.

J- É, na verdade, entrou um trabalho no repertório, trabalhamos ele o ano inteiro, não só na produção, mas a questão artística. Ah, rolou um espetáculo, tenho que olhar os materiais antigos. É um trabalho contínuo. Então temos que fazer uma questão de tudo, é um trabalho artístico. O Encontro de Palhaços tem um agravante, ainda não temos uma produtora, e temos que assumir papel como uma produtora, e isso envolve muitos artistas, um espetáculo com um monte de gente.

X- Pra você ter uma ideia, trabalhamos com uma equipe com quase 140 pessoas contratadas e tínhamos no sábado, na abertura, umas 120 pessoas, palhaços. Veio ônibus de Belo Horizonte, duas vans, e convidados. Mais de 100 pessoas. Então  você trabalha no Circovolante que são 5 pessoas, 2 em cena e 3 em produção, são cinco, para 150, ou quase isso. É uma loucura. Sendo uma cidade do interior, menor, temos mais controle. O circo é um espaço para a convivência, que as pessoas vêm,ficam conversando, trocando, um QG. No jardim acontecem apresentações, discotecagem, DJ no coreto. No SESI acontece mesa redonda, filmes. Espetáculos na Praça da Sé, e apresentamos em instituições também. Esse ano, estamos descentralizando, vamos fazer espetáculos em dois distritos, dois bairros, e é de graça, mas nem sempre as pessoas vêm, às vezes porque acham que o centro não é o lugar delas, às vezes porque não tem sapato, é difícil descer com três meninos e não tem dinheiro pra subir. Sempre quisemos descentralizar o encontro de palhaços e esse ano vamos conseguir.

T- E dentro do encontro tem os cursos também?

X- Tem um ateliê. Na verdade, a ideia de fazer os cursos também trabalhamos com a formação. Nós abrimos a seleção para grupos que tem um número, as pessoas escrevem o número, a gente tem um diretor, um palhaço,um orientador. As pessoas vêm, ficam 3 períodos de 5 dias, mostram o número e vão pra casa. Depois voltam com esse número melhor trabalhado, ficam mais 2 semanas. O encontro proporciona o cachê para a pessoa ficar aqui, oferece um figurinista e modelista, a pessoa passa essa temporada, e recebe uma verba para criar o seu número. O que fazemos não são oficinas, é esse ateliê que desemboca no final a criação de um novo número. Temos em todo encontro.