Ouro Preto e o abandono animal

O tratamento dedicado aos animais de rua na cidade

Por Lorrany Goulart e Raquel Lima

Foi durante a Revolução Industrial do século XVIII e XIX que surgiram os aglomerados urbanos, que intensificaram a relação dos homens com animais de estimação. Mas o que fazer com os animais “excedentes”? O sacrifício foi a escolha. A política de captura e extermínio foi estimulada, principalmente entre as décadas de 70 e 80. Como o controle de zoonoses era parco no campo de tratamento, animais que tinham qualquer sinal de doença eram recolhidos pela carrocinha. Atualmente não são essas doenças que matam esses animais, já que o campo farmacêutico na área da veterinária está se expandindo. Hoje, a principal causa de mortes é a falta de políticas públicas e do cumprimento das leis, resultando em descontrole populacional e abandono.

A Organização Mundial de Saúde (OMS) estima que no Brasil sejam abandonados, por ano, aproximadamente 10 milhões de gatos e 20 milhões de cães. Em Belo Horizonte – MG, são trinta mil cães e entre 3 e 5 mil gatos, segundo estimativas. Os motivos dados para o abandono são dos mais variados e até absurdos. Os donos usam todo tipo de desculpa para se justificarem: “quando eu o comprei não achei que fosse crescer tanto”, “vou me mudar e na outra casa não tem espaço para ele”, “ele já está velho, vai morrer logo”, “ele me dá mais gastos do que eu imaginava”.

Compromisso

Quando você compra ou adota um animal você assume um compromisso de longo prazo. A expectativa de vida de um cão é entre 12 a 14 anos e a de um gato de 15 a 20 anos. E eles não servem apenas para o dono dizer que possui um animal, são seres vivos e criam laços afetivos com seus donos. Merecem, portanto, ser tratados com carinho e respeito. O abandono e os maus-tratos são crimes previstos no código penal brasileiro.

Em Ouro Preto-MG não há uma pesquisa que disponibilize números exatos, mas basta andarmos pela cidade para percebemos que essa triste realidade é presente. No campus da Universidade Federal de Ouro Preto (UFOP) o número de animais soltos está cada vez maior.

Mas qual o posicionamento da Prefeitura em relação a esses animais? Há alguma ONG responsável por recolhê-los, dar-lhes o tratamento necessário e depois os encaminhá-los a um lar?

foto: Fernanda Mara

foto: Fernanda Mara

A resposta é não. O que há na cidade histórica é o grupo “Amigos dos Animais”, composto por pessoas que recolhem animais da rua, assumem os custos dos tratamentos e se encarregam de achar lares para os pequenos animais. A doutoranda Fernanda Mara Fonseca-Silva, formada em Ciências Biológicas pela UFOP, já resgatou e adotou duas cadelas de rua em Ouro Preto. Na primeira vez, acolheu “Flecha” e, ao comunicar a Prefeitura da situação do animal, que andava “de um lado para o outro” de um córrego no bairro Água Limpa, a Prefeitura se responsabilizou em mandar o carro da Zoonose (carrocinha) para o local. Mas quando perguntados sobre que destino o animal teria, a reposta da pessoa responsável foi de que não saberia informar. O Corpo de Bombeiros disse que faria a busca, mas não teriam como acolher o animal por falta de lugar público com esse propósito. A segunda cadela, Faísca, foi achada vagando na rua, machucada e maltratada. Após o resgate de ambas foi a própria Fernanda quem teve que arcar com todas as despesas do tratamento da cadela. Ao ser procurada para responder as nossas perguntas, não encontramos na prefeitura alguém que quisesse falar a respeito.

foto: Fernanda Mara

foto: Fernanda Mara

Uma das maneiras mais usadas atualmente para resgate de animais é pela internet, principalmente via redes sociais, onde é possível encontrar grupos de pessoas que arrecadam fundos para cuidar de animais achados na rua, fazem os resgates e os acolhem nas próprias casas enquanto não acham um lar definitivo.

Essas pessoas, junto com as diversas ONGs espalhadas pelo país, fazem um trabalho significativo e relevante, merecendo reconhecimento. No entanto, não é possível conviver comodamente com a gravidade do problema, deixando de cobrar do poder público o cumprimento do seu dever. A punição correta para os agressores é outro elemento importante, assim como a possibilidade de fomentar novas políticas públicas sobre o tema e educar a população sobre a posse responsável.

O que dispõe o Artigo 32 da Lei nº 6.503/98:

“Praticar ato de abuso, maus-tratos, ferir ou mutilar animais silvestres, domésticos ou domesticados, nativos ou exóticos”: Pena – detenção, de três meses a um ano, e multa.

§ 1º.  Incorre nas mesmas penas quem realiza experiência dolorosa ou cruel em animal vivo, ainda que para fins didáticos ou científicos, quando existirem recursos alternativos.

§ 2º.  A pena é aumentada de um sexto a um terço, se ocorre morte do animal.

Compreende-se por maus-tratos:

Abandonar, espancar, envenenar, deixar o animal sem comida ou água, prendê-lo em corrente em local pequeno e sujo, deixá-lo em ambiente fechado sem ventilação, não levá-lo ao veterinário quando estiver doente ou machucado ou qualquer ato de violência.

Maneiras para denunciar o infrator:

1) Delegacia de Polícia local: registre um Termo Circunstanciado (Obs. o Delegado ou escrevente não pode em hipótese alguma se recusar em registrar a ocorrência sob pena de sofrer punição pela Corregedoria);

2) Ministério Público Local (Obs: o Promotor de Justiça é responsável pela defesa do meio ambiente que inclui a proteção dos animais);

3) Boletim Eletrônico: acesse o site da Secretaria de Segurança Pública e faça sua denúncia;

4) Polícia Militar Ambiental: 0800 13 20 60;

5) Denúncia Anônima: disque 181.

Punição

Pela Constituição de 1998, os animais são tutelados pelo Estado, ao qual cabe o dever de protegê-los. Os atos de abuso e de maus-tratos configuram crime ambiental e devem ser comunicados à polícia, que registrará a ocorrência, instaurando inquérito.  A autoridade policial está obrigada a proceder a investigação.

Como denunciar:

Toda pessoa que testemunhe atentados contra animais pode e deve comparecer a delegacia mais próxima e lavrar um Termo Circunstanciado, espécie de Boletim de Ocorrência (BO), citando o artigo 32 da Lei Federal de Crimes Ambientais 9.605/98, “Praticar ato de abuso e maus-tratos à animais domésticos ou domesticados, silvestres, nativos ou exóticos “. .

Denúncias por telefone devem ser feitas pelo “Disque Denúncia”, que em Minas Gerais atende pelo número 181.

Coisas que você precisa saber sobre a carrocinha

fonte: UIPA  (link)

“Carrocinha” é como são conhecidos os Centros de Controle de Zoonoses (CCZs), órgãos municipais encarregados de capturar e sacrificar cães e gatos sem dono.

1. A carrocinha mata. Somente uma pequena parte dos animais recolhidos são resgatados pelos donos ou adotados pela comunidade. A maioria dos cães e gatos s ão sacrificados ou doados para estudo em universidades, onde muitas vezes são torturados em experiências dolorosas (vivissecção), após as quais a morte é um verdadeiro alívio.

2. A própria Organização Mundial da Saúde NÃO recomenda a captura e extermínio de cães e gatos como forma de controle populacional e combate às zoonoses (doenças transmitidas por animais) e aponta como medidas eficazes a esterilização e a educação para a posse responsável de animais de estimação. A “carrocinha”, além de ser um método cruel e ilegal, não representa solução para os bichos sem dono nos centros urbanos, não é humanitária, não é econômica e nem racional.

3. Os órgãos de Saúde Pública costumam dar a transmissão de doenças como desculpa para a matança de animais domésticos. Em geral os cães e gatos contraem doenças devido à negligência e falta de informação da própria comunidade, principal responsável pelo abandono de animais nas vias públicas. Enquanto a população não for orientada, continuará permitindo a procriação descontrolada de animais que passarão a viver nas ruas sem alimentação, higiene e cuidados preventivos, tendo como conseqüência as doenças. Trata-se de um ciclo vicioso onde os animais são vítimas da irresponsabilidade dos seres humanos. A tentativa do poder público de apresentar os animais como “criminosos”, verdadeiras ameaças ao bem estar dos seres humanos, além de injusta, infere pânico à população, contribuindo ainda mais para sua ignorância com relação ao assunto, além de incentivar atos ilegais de abandono e maus tratos. Outra desculpa para a matança é que todos os animais recolhidos estão doentes, o que não é verdade. Eles, então, não merecem uma chance de serem curados?

4. Em nome da saúde pública, atrocidades estão sendo cometidas pelos Centros de Controle de Zoonoses (CCZs) em todo o Brasil, com denúncias de animais mortos em câmaras de descompressão (o animal fica até dez minutos agonizando para morrer sem ar), por injeção letal sem aplicação prévia de anestésico, com eletrochoques(são molhados os pisos dos canis e um fio desencapado é usado para o choque) e até a pauladas(filhotes morrem assim também).

5. A maneira como os animais são capturados pode causar mutilação e ferimentos. Estes animais não são tratados e morrem em agonia.

6. Os CCZs sacrificam animais lá entregues por seus próprios donos. Este fato lamentável ocorre por diversas razões, desde a falta de condições de pagar tratamento veterinário, até por que o animal velho está sendo substituído por um filhote. A Prefeitura está não só utilizando indevidamente o dinheiro do contribuinte. Abre portas para uma forma cômoda de descarte, incentivando o comportamento irresponsável.

O que acontece com os cães na carrocinha

1. Ele é laçado sem delicadeza e jogado dentro do caminhão de apreensão, onde já estão outros cachorros também assustados e machucados e que lutam com desespero para tentar escapar.

2. Chegando ao depósito de animais eles são colocados em sua gaiola coletiva, à espera de que seu dono vá buscá-los e pague uma taxa para retirá-los.

3. No segundo dia seu cachorro é levado para uma segunda gaiola e ainda aguarda sem comer e sem beber por estar traumatizado ou ferido. Há vários casos de canibalismo entre os animais por fome.

4. No terceiro dia ele é levado para a gaiola da morte, onde seus captores escolhem quais morrerão na câmara de vácuo e quais serão levados escolas de medicina veterinária e laboratórios, onde serão usados como cobaias em experimentos desnecessários e que só são incluídos nos currículos porque a carrocinha os captura. Esses animais usados em experimentos morrem após intensos sofrimentos.

5. Apelamos para que você não deixe seu cachorro na rua e nunca deixe seu portão aberto para que ele “dê uma voltinha”.

6. Se for necessário que ele vá a rua, leve-o com você seguro por uma coleira e guia. Dentro de sua casa o cachorro está seguro, pois invasão de domicílio é crime punido por lei.

7. Caso seu cachorro desapareça, procure-o no mesmo dia e nos dias seguintes em depósitos de animais apanhados pela carrocinha.

Essa é a Faísca atualmente, mostrando que o que ela precisava, era um pouco de amor.

foto: Fernanda Mara

foto: Fernanda Mara