Posted by admin On novembro - 6 - 2012

Por: Alexandre Anastácio, Filipe Barboza, Jéssica Romero, Nara Bretas, Tamara Martins


O portal Carta Maior é um espaço que tenta, em algumas publicações, levantar reflexões a respeito dos grandes veículos de comunicação do Brasil e do mundo. É exemplo disso o texto do jornalista Marcel Gomes: ‘Mensalão’: Os 6 argumentos dos que acusam o STF de promover um julgamento de exceção, publicado no dia 26 de setembro de 2012. Nele, o autor traça algumas características da cobertura dos grandes jornais em relação ao julgamento do mensalão e evidencia alguns argumentos críticos em torno do fato.

A partir do texto publicado no Carta Maior e de uma pesquisa recente no portal do jornal O Globo procuramos encontrar exemplos que podem – ou não – dialogar com o assunto proposto. A ideia desse trabalho é verificar, a partir de algumas perspectivas, se os seis argumentos dos que acusam o STF de promover um julgamento de exceção estão presentes nos conteúdos noticiosos do portal carioca.

Vamos ainda, aproveitar essa análise para elencar critérios da Crítica da Mídia, principalmente, em relação aos enquadramentos e aos vieses dos conteúdos noticiosos do site.

É interessante lembrar que esse exercício de reflexão sobre a cobertura do mensalão não visa induzir ou afirmar que a revista online Carta Maior é um veículo isento em sua análise, nem que o jornal O Globo é tendencioso em suas publicações. O que propomos aqui é: sobrepensarmos sobre o papel da grande mídia em relação às causas de interesse público a partir de uma análise já pré-existente. Chegamos assim em uma análise da análise.

*1) Pressão da grande imprensa

2) Protagonismo da teoria do “domínio do fato”

Neste argumento, a matéria do portal Carta Maior se fundamenta na teoria do “domínio do fato” para criticar a cobertura e o julgamento do mensalão. A revista online sugere que os ministros do STF (Supremo Tribunal Federal) estão interessados em fazer certos julgamentos mesmo com falta de provas, ou seja, para condenar alguns réus é necessário considerar que pode haver crimes sem pistas, testemunhas ou documentos.

Um destes casos é o do ex-ministro José Dirceu, que aparece como um dos protagonistas do texto: “José Dirceu é condenado por corrupção ativa pelo placar de 8 a 2”, publicado no dia 10 de outubro. A matéria foi escrita após a condenação de Dirceu e se utiliza dos discursos de condenação dos ministros para explicar o que ocorreu no julgamento. Não foi utilizada nenhuma outra fonte além da reprodução das falas ditas pelos ministros do Supremo, o que pode ser um fator relevante para percebermos o enquadramento da notícia: o de legitimação da teoria usada pelos ministros.

Uma das falas destacadas pela cobertura do portal O Globo é o pronunciamento do ministro Celso de Mello defendendo abertamente a teoria de “domínio do fato”. Dessa forma, sem ouvir e propor outras fontes que discordam ou comentam sobre a repercussão do julgamento, o Jornal O Globo propõe uma única análise interpretativa: a de que a teoria é correta e funcional para o caso.

3) Nova interpretação do crime de lavagem de dinheiro

No terceiro argumento, Marcel Gomes chama a atenção para uma diferenciação de interpretações de crimes. Para ele, o que se entende por lavagem de dinheiro ganha uma nova interpretação a partir do julgamento do mensalão.

A matéria: “Barbosa absolve Duda Mendonça por lavagem de dinheiro no mensalão”, do dia 15 de outubro, cita o assunto, no caso o termo “lavagem de dinheiro”, por ser uma atribuição presente no julgamento e, mais precisamente, na “agenda” daquele dia. Isso se repete em “Por maioria, STF condena 8 e inocenta 2 por lavagem de dinheiro no mensalão” e também na nota “Valério participou de toda lavagem de dinheiro do mensalão—relator”. Do ponto de vista temporal, as notícias estão corretas. Todas elas citam acontecimentos diários em relação ao que se decide no julgamento. Entretanto, e é essa a crítica da matéria do portal Carta Capital, nenhuma das publicações colocaram o questionamento sobre a nova interpretação do termo “lavagem de dinheiro” em evidência.

O que Marcel Gomes tenta mostrar nesse argumento é que, a mídia não está repercutindo um fato que merece ser discutido já que pode trazer resultados, direcionamentos e novas precedências no judiciário. É como se não houvesse um questionamento maior em relação às decisões do Supremo.

4) Tratamento distinto do “mensalão tucano”:

A Carta Maior é um veículo que assume abertamente sua posição política: a esquerda. O próprio slogan da revista online é “Carta Maior, O portal da esquerda’” e seu conteúdo é todo pautado e produzido através desse viés político. Diferentemente disso, o jornal O Globo, não assume abertamente suas posições políticas e, em seus princípios editoriais, se declara isento e em defesa de um jornalismo apartidário e completamente independente de grupos econômicos.

Essas ressalvas servem para nos mostrar que esses dois portais produzem conteúdo jornalístico de forma distinta, principalmente, por causa de seus princípios editoriais diferenciados.

O quarto argumento do jornalista Marcel Gomes no portal Carta Maior aponta uma diferença de tratamento pelo STF entre o atual julgamento do caso do mensalão, que muitos denominam de “petista”, e o mensalão “tucano”, que ainda não foi julgado. O portal apresenta argumentos embasados em decisões do judiciário para provar sua tese e sendo, declaradamente, um portal de esquerda, denuncia o possível favorecimento ao PSDB, um dos maiores partidos da direita brasileira. Sendo assim, é possível dizer que a Carta Maior usou do enquadramento noticioso para revelar ao leitor a possível distinção de tratamento feita pelo STF, como também do enquadramento interpretativo, apresentando uma leitura política do acontecimento, ou seja, um veículo de esquerda denunciando um favorecimento a um partido de direita.

Já no Jornal O Globo, as matérias que citam o mensalão “tucano” no contexto atual do julgamento do mensalão “petista” têm um enquadramento diferente. Na notícia: “Lula após condenação de Dirceu: É preciso manter a cabeça erguida”, publicada no dia 9 de outubro, o jornal repercute o julgamento do ex-ministro José Dirceu através da fala do ex-presidente Lula, petista de maior destaque do partido e um grande representante da esquerda no país. No entanto, ao contrário da Carta Maior, O Globo não ousa assumir qualquer posição política e usa do enquadramento de conflito para falar dos dois casos de corrupção.

5) Julgamento em pleno período eleitoral

Em um quinto argumento, o texto da Carta Maior fala da “Contextualização temporal do julgamento”. Gomes explica que o julgamento do mensalão acontece simultaneamente às eleições municipais. Com isso, a grande mídia e os partidos de oposição utilizam-se dessa ferramenta para danificar a imagem de candidatos do PT.

Na matéria, publicada, no dia 02 de outubro, do portal O Globo, intitulada: “Patrus não responde sobre mensalão no debate Record Minas”, o acontecimento que está sendo coberto pela imprensa é o ultimo debate para a eleição municipal em Belo Horizonte. Entretanto, a matéria usou de um fato isolado para trazer a tona o mensalão.

O candidato Patrus Ananais, do PT, que não tem nenhuma acusação ou citação referente ao julgamento do mensalão, foi questionado sobre o assunto no debate e optou por não responder. O “silêncio” do candidato petista se transformou em notícia. Esse enquadramento proposto nesta matéria pode provocar um efeito perigoso: a associação do ato de corrupção de alguns membros ao partido inteiro. É como se todas as pessoas que têm ligação com o PT estivessem inseridas, automaticamente, no mensalão.

6) Preconceito contra a política e o campo popular:

No sexto e último argumento do texto, o autor afirma que existe um discurso preconceituoso contra os políticos, em especial os do campo popular, na fala de alguns ministros do STF. O autor afirma que essa discriminação provocativa não é surpresa, visto que, a própria grande mídia faz uso desse discurso, inclusive induzindo acusações contra os réus.

Na pesquisa feita no portal d’o Globo, há uma matéria que diz um pouco a respeito da sexta crítica de Gomes. “Julgamento do mensalão vira game no Facebook estrelado por Barbosa”, do dia 11 de outubro, fala de um game desenvolvido para uma rede social que coloca os réus como vilões, incluindo a “participação especial” do presidente Lula, e o relator Joaquim Barbosa como herói.

A matéria, da jornalista Luiza Barros, conta a história da “Batalha do mensalão”: um game em que “o jogador deve assumir o lugar do ministro Joaquim Barbosa para eliminar os réus Marcos Valério, Delúbio Soares, José Genoino e José Dirceu, que atiram de volta na direção do magistrado. O ex-presidente Lula sobrevoa a tela do computador, alheio à troca de disparos que acontece logo abaixo dele.”

Em todo o texto, palavras como “mensaleiros”, “eliminar”, “artilharia”, entre outras, colocam o julgamento no mesmo nível de um combate. E fica claro: já está definido o lado do bem e o lado do mal.

A única fonte da matéria – o desenvolvedor do game – não só responde do jogo em si, mas assume discursos da política, do julgamento e da acusação. Ele mesmo diz que o jogo é um exemplo de indignação da juventude. “Queremos mostrar que a juventude pensa sim no mensalão”, ressalta a fonte.

A matéria faz questão de ridicularizar uma figura popular como o ex-presidente Lula, além de brincar com a imagem dos réus. Esse maniqueísmo explícito dialoga com o argumento de Gomes, em que já existe um preconceito, ou seja, um conceito anterior, aos políticos acusados. É como se o julgamento estivesse terminado antes de chegar ao fim. Porque o preconceito, o senso comum e o discurso de parte da mídia dizem que políticos são corruptos.

*O primeiro argumento levantado por Marcel Gomes é sobre o risco de influência da mídia em relação ao julgamento do mensalão. Para comprovar e/ou exemplificar que o portal o Globo, em suas matérias, pressiona e até mesmo influencia nas decisões do STF, seria necessário um estudo muito mais aprofundado e demorado sobre o caso. Desse modo, é leviano afirmar em uma ou duas matérias que o portal tenta pressionar o julgamento. Nesse caso, o primeiro argumento do texto de Marcel Gomes não será analisado. Mas isso não significa dizer que ele não merece ser refletido.

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