Posted by admin On outubro - 21 - 2011

Por Juçara Brittes *

O terceiro exercício do semestre, postado em outubro, objetiva aplicar parâmetros de crítica de mídia recomendados por Danilo Rothberg e outros autores dedicados ao mídia criticism, em análise com tema livre. O autor utiliza o método do framing, ou enquadramento, que consiste em “marcos interpretativos mais gerais construídos socialmente que permitem as pessoas fazer sentido dos eventos e das situações sociais” (PORTO: 2004, p. 78, APUD ROTHBERG 2009, p. 23).

Trocando em miúdos, o trabalho consiste em analisar conteúdos jornalísticos para detectar qual tipo de enquadramento aquele veículo utiliza que tipo de enfoque oferece ao receptor. Dito de outro modo, visa identificar quais “pacotes interpretativos estão implícitos nas matérias”, oferecendo uma visão de mundo específica.

Estudos realizados em editorias de política permitiram a observação de parâmetros comumente utilizados nos jornais brasileiros, quais sejam:

Quadros de Conflito

Quando retratam os políticos como eternos personagens em disputa, sem mais considerações a arranjos envolvidos em determinados arranjos de força

Quadros de jogos

Os personagens são retratados como agentes movidos unicamente por estratégias competitivas, em busca de vantagens particulares

Quadros episódicos

Quando fatos e conjunturas de grandes repercussões recebem tratamento superficial e são enfocados somente a partir de seus traços mais extravagantes ou pitorescos

O autor chama atenção para uma falácia recorrente: o argumento de que informação abundante é suficiente para atender a demanda cognitiva do receptor.

Existem demandas cognitivas para o exercício dos direitos civis e políticos, pois vivemos uma democracia que admite, acolhe e incentiva variadas formas de participação nos processos de definição de políticas públicas, argumenta.  A partir deste entendimento, propõe trocar o volume pelo valor diagnóstico da informação.

Por qualidade de informação entende-se informação abrangente em nível suficiente para permitir avaliações embasadas sobre as consequências da adoção de determinadas políticas, de modo a fundamentar cálculos (reflexões/opiniões) sobre ganhos, perdas e formas de se obter equilíbrio entre eles.

Robert Entman (1993) caracteriza o framing de notícias como esquemas de processamento de informação, como a construção do conteúdo jornalístico a partir de uma espécie de “embalagem” particular. Para identificar o enquadramento de uma reportagem, Entman apresenta cinco elementos enfatizados na narrativa jornalística:

palavras-chave

metáforas

conceitos

símbolos

imagens

É preciso, portanto, encontrar a circunstância empírica do texto, o que pode ser feito com leituras atentas com vistas a detectar variáveis/ categorias analíticas.

Estas categorias podem ser criadas pelo analista, no caso, pela pessoa que realiza a crítica de mídia, e devem ser demonstradas no texto. Do contrário a crítica continua sendo uma opinião, quando não um diagnóstico mal fundamentado, o que é ainda pior.

Aquele que desejar entender melhor o trabalho da crítica de mídia, ou apenas entender melhor os conteúdos precisa ler os textos produzidos pela ANDI (Agência de Notícia dos Direitos da Infância) > http://www.andi.org.br/<

A Pesquisa intitulada Mídia e Políticas Públicas de Comunicação (cópia gratuita no portal) mostra a metodologia utilizada pelo trabalho, aliás, um documento obrigatório para profissionais, professores e estudantes de jornalismo.

Por exemplo:

Veículos pesquisados

A observação atenta dos perfis dos veículos que mais e menos publicaram textos acerca das Politicas Publicas de Comunicação (PPC) – e temas congêneres – apresenta-se como uma primeira medida importante de que os interesses em jogo nesse debate interferem diretamente no desenho das tendências observadas na cobertura jornalística.

A amostra de três anos coletada pela ANDI permite identificar que a cobertura global dos mais diferentes temas associados as comunicações (…) está muito aquém da relevância da instituição midia para os regimes democráticos, conforme destacamos anteriormente.

O estudo aponta a media de 0,19 textos publicados por cada jornal diariamente – ou seja, somente a cada cinco dias os diários publicaram um artigo, coluna, editorial, entrevista ou matéria sobre o campo temático analisado.

Quando focalizamos as revistas – veículos para os quais estamos trabalhando com o universo total de conteúdos publicados no período – alcançamos a media de 0,43 textos/semana ou praticamente um a cada 15 dias. Se subtrairmos dessa conta o semanário Carta Capital – que deu maior destaque a cobertura sobre as politicas de comunicação –, essa media se altera para um texto ao mês.

Método de análise

No caso dos jornais, para a definição de uma amostra passível de analise, trabalhou-. se com o método de seleção de conteúdos conhecido como Mês Composto: para cada um dos anos considerados – 2003, 2004 e 2005 – foram sorteados 31 dias aleatoriamente, observando-se a representatividade dos meses do ano (meses com 31 dias contavam com mais unidades na amostra do que aqueles com 28 ou 30 dias) e dos dias da semana (buscou-se obter um volume semelhante de segundas, terças, quartas, quintas, sextas, sábados e domingos). Assim, nosso quadro amostral contou com 93 dias. Já para as revistas, em função do volume mais reduzido de conteúdos a serem analisados, foi considerada a totalidade dos textos. Os veículos foram escolhidos com o objetivo de permitir comparação com outras analises conduzida anteriormente pela ANDI. Nesse sentido, elegeu-se quatro revistas semanais de circulação nacional e dois dos principais veículos de cada unidade da federação – sendo que estados como São Paulo, Rio de Janeiro e Minas Gerais acabaram contando com mais de dois representantes, dada a importância dessas localidades para o debate nacional.

Palavras-chave selecionadas pela pesquisa:

Expressões gerais

1. comunicação de massa

2. comunicação e desenvolvimento

3. comunicação para o desenvolvimento

4. comunicação pelo desenvolvimento

5. comunicação social

6. concentração da propriedade

7. concessionários de radio

8. concessionários de TV

9. conglomerados de comunicação

10. conglomerados de midia

11. controle do conteúdo

12. democratização da comunicação

13. democratização da midia

14. empresa jornalística

15. empresas de comunicação

16. empresas de midia

17. espectro eletromagnético

18. grupos de midia

19. horário eleitoral

20. horário partidário

21. indústria cultural

22. midia e democracia

23. midia e politica

24. MMDS

25. padrão brasileiro + HDTV

26. padrão brasileiro + televisão digital

27. politicas de comunicação

28. politicas publicas de comunicação

29. proer da midia

30. propaganda eleitoral na TV

31. propaganda eleitoral no radio e TV

32. propriedade cruzada

33. propriedade da midia

34. propriedade dos meios de comunicação

35. propriedade horizontal

36. propriedade vertical

37. radio comunitária

38. radio digital

39. radio pirata

40. radiodifusão

41. rádios comunitárias

42. rádios piratas

43. televisão comunitária

44. televisões comunitárias

45. concessão + conquista

46. concessão + outorga

47. regulação + conteúdo

48. regulação + midia

49. regulação + televisão

50. renovação + concessão

51. sistema brasileiro + HDTV

52. sistema brasileiro + televisão digital

53. sbtvd

54. TV digital

55. TV educativa

56. TV publica

Direitos e liberdades

57. direito a voz

58. direito de antena

59. direito a comunicação

60. direito a expressão

61. direito de comunicação

62. direito de informação

63. direito do autor

64. direito humano a comunicação

65. liberdade de expressão

66. liberdade de informação

67. liberdade de opinião

68. propriedade intelectual

69. censura

Legislação

70. art. 220

71. art. 221

72. art. 222

73. art. 223

74. art. 224

75. código brasileiro de telecomunicações

76. lei 10359

77. lei 10597

78. lei 4117

79. lei 8977

80. lei 9472

81. lei 9612

82. lei de comunicação eletrônica de massa

83. lei de imprensa

84. lei do cabo

85. lei da TV a cabo

86. lei geral de telecomunicações

Questões de conteúdo

87. baixaria + televisão

88. código de conduta + TV

89. classificação indicativa

90. padrão globo de qualidade

91. produção independente – (menos) gravida

92. produção regional

93. proibição da propaganda

94. proibição da publicidade

95. propaganda dirigida as crianças

96. publicidade destinada as crianças

97. publicidade dirigida as crianças

98. publicidade infantil

99. qualidade da programação televisiva

100. regionalização da produção

101. regionalização da programação

102. restrição da publicidade

103. restrição da propaganda

Organizações

104. Agencia Nacional de Telecomunicações

105. Agencia Nacional do Cinema e do Áudio -visual

106. Associação Brasileira das Emissoras Publicas,

Educativas e Culturais

107. Associação Brasileira de Emissoras de Radioe Televisão

108. Associação Brasileira de Produtores Inde -pendentes de Televisão

109. Associação Brasileira de Radiodifusão

Comunitária

110. Associação Brasileira de Radiodifusão e Telecomunicações

111. Associação Brasileira de Radio difusores

112. Associação Brasileira de Televisão Universitária

113. Associação Brasileira de TV por Assinatura

114. Comitê Gestor da Internet

115. Conselho de Autorregulamentação Publicitaria

116. Conselho de Comunicação Social

117. Conselho Federal de Jornalismo

118. Ética na TV

119. Fórum do Audiovisual e do Cinema

120. Fórum Nacional pela Democratização da Comunicação

121. Ministério das Comunicações

122. Quem Financia a Baixaria e Contra a Cidadania

123. ABEPEC

124. ABERT

125. ABPI

126. ABRA

127. ABRATEL

128. ABTA

129. ABTU

130. Anatel

131. ANCINAV

132. CJF

133. CONAR

134. Federação Nacional dos Jornalistas

135. FENAJ

136. FNDC

137. Intervozes

Com palavras-chave, dias e veículos definidos, um processo de busca eletrônica selecionou um conjunto de textos que, após um processo de triagem manual, resultou nos 1.184 que foram efetivamente analisados pelo presente estudo.

Com o universo delineado, um instrumento de pesquisa, contendo as principais categorias a serem investigadas, foi construído. Um grupo de classificadores foi treinado em seu manuseio, viabilizando a aplicação a cada um dos textos. O instrumento estava estruturado, em linhas gerais, da seguinte forma:

1. Identificação do material: variáveis que permitiam extrair informações básicas de cada um dos textos (veiculo, cidade, data, titulo).

2. Segmentos e sistemas: nesse momento, buscou-se verificar a quais segmentos (televisão, radio, etc.) e setores (privado, estatal, educativo) os textos se remetiam.

3. Foco geográfico: esta seção do instrumento teve por objetivo capturar as localidades retratadas pelo material analisado.

4. Foco central: o principal tema discutido pelo texto pesquisado era identificado nesta seção do formulário de analise de conteúdo. Posteriormente, alguns temas contavam com um segundo nível de detalhamento. Eram eles: horário eleitoral, midia e democracia, midia e politica, midia e poder, questões de conteúdo, questões de infraestrutura e questões tecnológicas. As questões de conteúdo e as tecnológicas ainda passavam por um nível adicional de analise.

5. Enquadramento do foco: com o foco central delimitado, os classificadores passaram a identificar a principal perspectiva sob a qual esse determinado assunto foi reportado pelos textos (individual, governamental, da sociedade civil ou temático eram algumas das possibilidades).

6. Perspectiva governamental: esse enquadramento passava por uma analisemais detalhada.

7. Casos específicos: 12 casos ocorridos no período analisado mereceram uma atenção particular da ficha de classificação. Foram eles:

a. Adoção de um padrão brasileiro de TV digital

b. Agencia Nacional do Cinema e do Audiovisual (Ancinav)

c. Campanha Quem Financia a Baixaria e Contra a Cidadania

d. Conselho Federal dos Jornalistas (CFJ)

e. Classificação indicativa

f. Empréstimos a midia pelo BNDES

g. Expulsão do jornalista Larry Rother

h. Fechamento de rádios comunitárias

i. Gugu Liberato (caso PCC)

j. Lei da mordaça

k. Projeto de regionalização da programação

l. Regulamentação/proibição da publicidade de bebidas alcoólicas

8. Censura e liberdade de expressão e de imprensa: um detalhamento da cobertura que mencionava ao menos um desses conceitos também foi possível a partir da ficha de classificação elaborada.

9. Questões gerais: uma serie de aspectos binários (presença ou ausência) era checada pelos classificadores através do formulário desenhado (gênero, raça/ etnia, responsabilidade social empresarial, eleições ou tratamento dispensado a população eram algumas das categorias presentes).

10. Questões jornalísticas: atores mencionados nos textos; fontes de informação; formas de inclusão na pauta; nível de contextualização; menção a causas, soluções. e consequências e os tipos de texto jornalístico fecham o instrumento de pesquisa.

* Professora responsável pela disciplina Crítica da Mídia na Universidade Federal de Ouro Preto

Chefe do Departamento de Ciências Sociais, Serviço Social e Comunicação Social/Jornalismo – DECSO – ICSA – UFOP

Coordenadora do  GP Políticas e Estratégias de Comunicação da Sociedade Brasileira de Estudos Interdisciplinares da Comunicação – Intercom

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