Posted by admin On maio - 5 - 2015

Por Marília Mesquita, Priscilla Santos, Silmara Filgueiras e Stênio Lima

Desde a República proclamada há 125 anos é evidente que a política econômica do Brasil dita o desenvolvimento social do país: seja a economia baseada na exportação de café em um sistema de oligarquias da elite, como aconteceu na República Velha, ou na economia consolidada da Nova República, que em um contexto de recuperar a economia criou o Plano Real.

Hoje, segundo o Fundo Monetário Internacional (FMI), o Brasil ocupa a sétima posição de maior economia do mundo, porém a desigualdade social, a inflação e as taxas de impostos são ainda assuntos que recaem sobre os ombros, os bolsos e principalmente sobre o Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) dos brasileiros.

Em decorrência do lançamento do best seller O capital do século XXI, o francês Thomas Piketty divulgou estudos sobre a concentração de riquezas e a tendência do capitalismo em criar um círculo vicioso de desigualdade social. Embasado em dados de uma lista de mais de vinte países, da qual o Brasil não compõe por falta de transparência das informações necessárias, o material publicado em 2013 tornou referência entre estudos econômicos e foi comentado mundialmente.

No programa Roda Viva, veiculado no canal Tv Cultura na noite de 9 de fevereiro de 2015, a bancada de entrevistadores formada pelo economista André Lara Resende e os jornalistas José Paulo Kupfer, Ricardo Ferraz, Robinson Borges, Vinicius Torres Freire, e mediada por Augusto Nunes, recebeu Piketty para falar sobre economia, contradições do capitalismo, além de pesquisas que embasaram sua obra.

 Os entrevistados

Naturalmente, as questões levantadas pelos entrevistadores também expuseram análises e opiniões individuais sobre a realidade do país. André Lara Resende é formado em Economia pela PUC-Rio e PhD pelo Instituto de Tecnologia de Massachusetts, nos Estados Unidos. Foi assessor especial da presidência da República a convite de Fernando Henrique Cardoso e chamado de Tucano em referência ao Partido da Social Democracia Brasileira (PSDB). Foi também conselheiro econômico na campanha eleitora de 2014 da candidata à presidência Marina Silva. Dos dois partidos que se envolveu, o PSDB usou de uma política econômica liberal sendo lembrado pelas privatizações de setores como telecomunicação e companhias de energia, e o PSB defendeu no plano de governo proposto nas eleições questões muito parecidas com as do PSDB, como corte de gastos públicos e reaproximação comercial com os Estados Unidos.

Logo na primeira pergunta, Lara Resende afirma que discorda de dois argumentos utilizados por Piketty, do qual aponta um deles: a conclusão que o agravamento da desigualdade dos últimos anos poderá levar a sociedade a ser estratificada como na Belle Epoque (1871-1914). Um dos arquitetos do fracassado Plano Cruzado, no governo Sarney em 1986, e do bem sucedido Plano Real, no governo Itamar em 1994, o economista justifica através da pouca mobilidade social e da ausência da riqueza por mérito naquela época, o que segundo ele é incompatível com a democracia e com a riqueza que considera efetiva, a riqueza fruto da inventividade, do capital humano, da capacidade de criar novos produtos, novas necessidades e novas tecnologias, e não, simplesmente, a riqueza por acumulação de capital.

Em seguida, Lara Resende afirma que a interpretação do grande público sobre o livro é de uma sensação pró-intervencionista do governo, sendo essa a grande crise do livro. Segundo ele, o governo aparece como um agente isento, onisciente e defendendo exclusivamente o bem público, enquanto na teoria política o governo é um agente com interesses próprios, confusos e que quando chega a um certo número de intervenções passa a ser “inadministrável”. E completa, ainda, que a taxação proposta de Piketty talvez não funcione como uma funcionalidade social, devido o patrimônio dos muito ricos não aumentar muito a arrecadação fiscal.

Por fim, o economista coloca que investidores e criadores apropriam apenas de 2% do valor social das suas invenções e questiona a Piketty, se dado o valor social das invenções, ele não considera os valores baratos a pagar pelo extraordinário. 

Considerando o sistema tributário brasileiro o mais regressivo que poderia haver, capaz de desestimular o cidadão, José Paulo Kupfer inicia sua participação na entrevista. Após ocupar vários cargos de importância no meio jornalístico, entre eles editor-chefe de publicações como O Globo, Veja e Exame, Kupfer hoje colabora durante o mês com Colunas no O Estado de S. Paulo, o Estadão. Por duas vezes indagou sua preocupação com as taxas, mencionando exemplos internacionais através de países que mesmo reduzindo os juros a zero continuaram com a economia estagnada.

Repórter da Tv Cultura, Ricardo Ferraz, é o único entrevistador que não trata diretamente da economia. O primeiro ponto que destaca é o mérito de Piketty em tratar da desigualdade para além da questão moral e questiona o porquê da resistência dos governos em implantar políticas capazes de  reverter o quadro de desigualdade. Depois apela para a sustentabilidade, questionando se os recursos naturais que estão diminuindo poderiam acelerar esse processo.

No parâmetro brasileiro, Ricardo remete ao programa Bolsa Família e a propaganda do governo nacional quanto à diminuição significativa da desigualdade social, e coloca que pesquisas da Universidade Federal de Brasília (UnB) aponta que o problema no Brasil não vem diminuindo como está sendo divulgado. Dessa forma questiona, no modo prático, se a política brasileira de transferir renda para as pessoas mais pobres é uma medida que deve ser exportada do Brasil.

Robinson Borges foi redator da Rede Record (1989-1991), do jornal Folha de S. Paulo (1992-1998), trabalhou como editor-assistente do Jornal da Tarde (1999-2000) e hoje é editor do jornal Valor Econômico (desde 2000). O Valor Econômico possui um dos mais conceituados conteúdo voltado para economia, finanças e negócios do Brasil e garante uma “equipe de jornalistas altamente especializada que produz um noticiário que ajuda a identificar oportunidades e apoia decisões que levam a grandes negócios”.

Robinson levantou pontos para uma boa discussão, principalmente para o cenário econômico que o Brasil se insere. Ciente do seu papel como jornalista, estruturado pelo meio de comunicação que trabalha, Robinson abre suas perguntas a partir de indagações fundamentadas nas colocações que Piketty já fez. Logo no início ele chama a atenção para o crescimento econômico dos “mais elevados” às instituições democráticas. A partir daí, ele quer saber qual o resultado desse crescimento. Apesar de Thomas Piketty não possuir acesso às informações brasileiras, Robinson fala sobre a conquista de algumas informações oficiais vindas de pesquisadores brasileiros para realizar estudos. Nesses termos, ainda que restrito, questiona Piketty sobre a pretensão de estudos sobre o Brasil a partir da liberação do acesso aos dados. Robinson também aborda a taxação, cita o contexto da desigualdade como fator importante para a manutenção do capitalismo e do empreendedorismo e por último atribui a semelhança da sua obra com as ideias defendidas pelo filósofo Karl Marx.

Vinicius Torres Freire, colunista da Folha de São Paulo desde 1991, escreve diariamente sobre política e economia. Na bancada, questionou Piketty sobre se a solução para a economia não ser aliviar os Bancos Centrais e exigir mais das políticas fiscais, assunto que comentou na sua coluna de 6 desse mês: “Pouco se tem lembrado que a conta cai no lombo de pessoas reais. Somado aos efeitos da inflação, de outro ano de queda da renda nacional, de juros mais altos e menos empregos, o ajuste fiscal deve ter mais efeitos políticos do que o listão do Janot.”

 

Vale Destacar:

“Presidente Dilma” aparece por 2 vezes

A palavra “acho” é usada por 7 vezes

O entrevistado é tratado como “você” 13 vezes, sendo 10 delas pelo entrevistador André Lara Resende. Os outros entrevistadores usam o vocativo “senhor” que aparece por 32 vezes e “professor” que aparece 5.

Presente por toda a entrevista o negativo ‘não’ aparece por 52 vezes.

A palavra taxa e seus derivados aparecem por 20 vezes.

Aproximadamente 3500 palavras em 1h20 de entrevista.

 
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