Posted by admin On setembro - 3 - 2013

      por Samuel Perpétuo, Giuseppe Rindoni, Thiago Novais, Luiz Fernando

O objeto escolhido para a análise crítica do grupo foram dois jornais impressos: Folha de S. Paulo, de edição diária, e o Brasil de Fato, com edição semanal. O marco inicial são os atos organizados pelo Movimento Passe Livre em São Paulo nos dias 6 e 7 de junho contra o aumento das tarifas municipais de ônibus, trens e metrô. O Brasil de Fato noticia as manifestações com a legitimidade dos protestos e contesta a ilegalidade da repressão policial aos manifestantes. Já a Folha, em suas primeiras edições, apresentou os manifestantes pelo viés de vandalismo e da baderna. Ela, inclusive, utilizou, em algumas de suas primeiras capas relativas aos protestos, esses termos para descrevê-los.

A primeira matéria do Brasil de Fato sobre as manifestações em São Paulo delimita um passado para esse evento ao selecionar outras manifestações de mesmo intuito e caráter ocorridas em outras capitais, como Florianópolis, Porto Alegre, Vitória, Teresina, Natal e Aracajú. Além de anunciar o ato posterior a esta matéria, a construção da cobertura do jornal semanal indica o aumento do número e da resistência dos manifestantes no decorrer dos protestos frente à repressão policial. Em contrapartida, a Folha inverte os papéis de vilão e mocinho quando os protestos ganham apelo popular nacional. Os manifestantes, baderneiros até então, passam a serem tratados como cidadãos brasileiros indignados com a atual situação política do país. Nesse momento, a tropa de choque, vista como reguladora da ordem nas edições anteriores, é retratada agora como opressora.

Os protestos reportados se inscrevem no cenário das avenidas e praças centrais de São Paulo, regiões de grande importância econômica e política, mas que não poderiam comportar, segundo o Estado, as manifestações sociais. A inscrição desse evento no centro de São Paulo aumenta o poder de discussão de suas causas pela importância que o lugar representa e pela empatia que causaria as alterações de sua conformidade. O espaço da narrativa agora abrange diversos lugares além de São Paulo, como Brasília, Rio de Janeiro, Belo Horizonte, Fortaleza, Vitória, Maceió, Belém, Salvador, Curitiba, Porto Alegre e Recife. Passam a ser identificadas  também 27 cidades no mundo se solidarizaram com os movimentos do Brasil.

A inscrição deste evento em diversas cidades contribui para a coesão e cria uma identidade de movimento nacional, que aumenta o sentimento de pertencimento dos leitores. O aumento das tarifas de ônibus, trens e metrô são organizados como as causas das manifestações. Nas manifestações, o afrontamento à ordem social, por interferências na rotina do trânsito e na condição física dos espaços públicos, provoca a repressão do poder executivo com guarnições militares e falta de abertura dos governos. Na cobertura do Brasil de Fato, o jornal incita a participação de mais manifestantes, enquanto a Folha tenta deslegitimar o caráter das manifestações para manter o discurso do governo.

As reivindicações principais pela melhoria e diminuição dos custos do transporte público permanecem à medida que o momento de discussão social levanta outras reivindicações, como a priorização de gastos para a Copa das Confederações e a indiscriminada remoção de pessoas para obras da Copa do Mundo. Além disso, outras pautas pertinentes aparecem, como contra a corrupção, violência urbana e etc. Nota-se, nessa inserção de outras pautas no protesto, um consentimento e apoio não só da Folha como de todos os outros grandes meios de comunicação do país.

A perspectiva da cobertura do Brasil de Fato busca sempre a validade das causas e implicações dos sujeitos nas manifestações. Os sentidos da narrativa são convocados pelas articulações dos sujeitos presentes nos atos e suas experiências, incluindo grupos organizados e simpatizantes das causas, de modo a alinhar as interpretações à perspectiva interna às manifestações. O caráter popular do movimento fez com que diversas “bandeiras” se juntassem nas ruas, mesmo que seus portadores não estivessem em plena discussão sobre suas causas. Isso foi apontado pelo Brasil de Fato como um risco de declínio do movimento e dispersão da discussão, e também de se tomar um caráter conservador oposto à vanguarda das ruas.  Quanto a isso, a Folha tem uma abordagem que parte de discursos hegemônicos, presentes nos ideais do governo e da classe A. A análise discursiva da Folha pode ser vista tanto nas primeiras edições do jornal, em que o protesto era descredibilizado por seus editoriais e matérias, quanto nas fontes escolhidas pelos repórteres.

Os atores convocados para a narrativa do Brasil de Fato são os organizadores, participantes e simpatizantes das manifestações. A Folha, em sua narrativa, procura da voz de fontes oficiais do poder público.

Dois jornais, três visões. O Brasil de Fato permaneceu com sua ideologia de iniciativa popular e procurou entender o motivo das manifestações terem ocorrido, seja pelo momento histórico que o país passava, seja pela angústia que a população de classe média e baixa do Brasil sente. Já a Folha, maior jornal do país, mudou seu posicionamento quando a aceitação de seu público a respeito dos protestos também mudou. Cabe agora a ambos os jornais cobrar a atuação política que se desencadeará por causa das ações populares. Veremos a mesma cobertura dos fatos a seguir?

Categories: Destaque

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