Posted by admin On abril - 14 - 2013

Por Flávia Silva, Kíria Ribeiro, Marcelo Nahime Jr., Thainá Cunha

 

A Agência de Notícias dos Direitos da Infância (ANDI) é uma organização sem fins lucrativos, que articula ações inovadoras para o desenvolvimento da mídia. Suas estratégias estão fundamentadas na promoção e no fortalecimento de um diálogo profissional e ético entre as redações, as faculdades de comunicação e de outros campos do conhecimento, a fim de qualificar as ações dos jornalistas junto ao tema “Infância e Adolescência”. Segundo o site da organização, este tema é importante e precisa ser tratado com cuidado pelo jornalista. A ANDI busca contribuir para que os jornalistas, nos conteúdos que produzem, saibam responder com responsabilidade ao tema da “Infância e Adolescência”.

Estudaremos sete edições aleatórias do jornal Ponto Final, impresso da cidade de Mariana, interior de Minas Gerais. Faremos uma análise acerca dos pilares que a ANDI utiliza em suas publicações. Com foco em disseminar a importância de se preservar a imagem das crianças e adolescentes, a ANDI elaborou Estatutos da Criança e do Adolescente que irão fomentar nossa pesquisa em cima do veículo mencionado.

O Jornal Ponto Final é um dos principais veículos que circulam em Mariana, e há 18 anos leva informação à comunidade, semanalmente, com assuntos da cidade e região. Nossa análise irá averiguar qual a abordagem que o Jornal concede ao tema da Infância e Juventude, seja na disposição das imagens, na qualificação dos textos e na seleção das fontes para as matérias produzidas.

Gostaríamos, portanto, de definir quais critérios utilizaremos para analisar as matérias do Jornal Ponto Final:

  • Seleção das fontes;
  • Utilização da imagem de personagens e fontes;
  • Enquadramento que o jornalista concede à matéria;

A partir dos critérios acima, iremos traçar um rumo em nosso estudo para dimensionar aspectos que são relevantes para a produção de uma matéria cujo assunto seja infância e adolescência. Vale salientar que encontramos esses critérios de análise na segunda edição do livro “Estatuto da Criança e do Adolescente – um guia para jornalista” produzido pela Rede ANDI Brasil. O livro pode ser encontrado na página da ANDI, na internet, e traz dicas de apuração, abordagem, sugestões de fontes e pautas relacionadas ao tema infância e juventude, de acordo com o Estatuto que foi criado como uma lei em 1990, a partir de uma mobilização social.

Critérios de análise

De acordo com a publicação, quando o jornalista seleciona uma fonte para colaborar com a construção da matéria, é de suma importância que tenha a perspicácia de compreender que a exposição da imagem de uma criança pode estar diretamente ligada à imagem de familiares e/ou membros da comunidade em que vive. A construção da narrativa não deve ser tendenciosa, dando pistas ao espectador sobre o quadro em que se encontra a personagem da notícia. Ao entrevistar uma criança ou adolescente, o jornalista deve ter autorização dos pais ou responsáveis antes. Não é recomendável que o profissional interpele diretamente os garotos, quando eles não tiverem poder para falar por si só. Por fim, o profissional jamais deve se esquecer de se apresentar-se como jornalista para não ir contra os códigos legislativos que regem os princípios da profissão.

Em se tratando das imagens e dos espaços destinados a elas nas matérias, o profissional precisa ter extremo cuidado na hora de fotografar as fontes. Não é recomendado pela ANDI, a veiculação de imagens de crianças trabalhando, por exemplo. Crianças que tenham sofrido violência e/ou exploração sexual também não devem aparecer nas narrativas de matérias jornalísticas. Por fim, verificamos que mais importante do que ter cuidado com a veiculação da imagem de menores, é conseguir manter o sigilo da fonte em relação ao possível risco que ela corre ao contribuir para a produção. O jornalista precisa cuidar para que nem a criança, nem pessoas próximas a ela sejam prejudicadas.

Escolher bem as fontes e saber usar adequadamente a imagem delas não exime o jornalista de elaborar muito bem o enquadramento a ser definido em sua matéria. O aspecto tendencioso em uma reportagem pode ser notado na maneira com que o editor do conteúdo elabora a matéria, seja no cenário eleito para ilustrá-la ou na forma que o jornalista usa do seu texto para dizer algo por trás do discurso contido na reportagem. Esses são fatores que exemplificam a necessidade do bom enquadramento que o profissional precisa dar às matérias referentes à temática da infância e juventude.

“O objetivo deste trabalho é facilitar a atuação dos jornalistas brasileiros, propondo caminhos para apuração que contribuam diretamente para a qualificação do debate público acerca da promoção e da garantia dos direitos de meninos e meninas.”

(Estatuto da Criança e do Adolescente, 2011, p.8)

 

Análise e Desenvolvimento

Começaremos nossa análise na Edição 781 do Jornal Ponto Final, de fevereiro de 2011. Nela encontramos uma matéria cujo título é “Prefeitura se responsabiliza pela merenda escolar, mas ainda utiliza equipamentos da COAN”. A reportagem é ilustrada com três imagens, sendo uma do prédio da prefeitura e outras de duas de crianças comendo merenda escolar. Essa matéria é a manchete principal da capa dessa edição do Jornal. No decorrer da matéria percebe-se que as crianças usadas para a ilustração sequer são mencionadas. A imagem dos garotos serve para dar ênfase à transação realizada entre a empresa COAN (cujo significado da sigla não é mencionado pelo veículo) e a Prefeitura Municipal de Mariana. Acusada de finalizar o contrato de fornecimento de merenda escolar com a COAN, a Prefeitura não se manifestou em relação à prorrogação do contrato que, segundo informações concedidas pela empresa, deveria ser restabelecido para que tudo voltasse aos conformes. A matéria conta também que a Prefeitura está usando os utensílios da COAN nas escolas para a produção das merendas, e ainda salienta que a quantidade de comida produzida nas escolas do município é incipiente para todas as crianças. O “Estatuto da Criança e do Adolescente- um guia para jornalistas” comenta a importância do cuidado ao utilizar a imagem de crianças e jovens. Na matéria, as crianças simplesmente são visualizadas como coadjuvantes pelo leitor, que é levado a compreender a caótica situação na qual elas se encontram nas redes de escolas públicas do município. O enredo da matéria expõe as crianças que sejam lembradas pelo leitor no decorrer da leitura, já que a merenda é representada pela figura dos pequenos. Por que não fotografar um prato de comida produzido nas escolas? A intenção do veículo é questionável e fica a dúvida se houve a autorização para a veiculação das imagens das crianças, junto aos seus superiores: pais e responsáveis. Nossa análise procura averiguar se o padrão da matéria está de acordo com os conceitos éticos da ANDI propostos a partir do ECA (Estatuto da Criança e do Adolescente). O enquadramento que encontramos na matéria é o da certeza de que a Prefeitura precisa dar um feedback às escolas do município, para que as crianças parem de ficar expostas ao risco presente na comida produzida, seja pela qualidade da produção ou na quantidade disponível. O veículo leva o leitor a enxergar a Prefeitura como culpada na situação, ao colocar na matéria as aspas da COAN se posicionando como se estivesse somente precisando de um posicionamento do poder público para voltar a trabalhar ou para recuperar os itens que ficaram nas escolas. Sendo assim, percebemos que as fontes escolhidas, dentre elas, Sindicalistas, a COAN e até mesmo denúncias que o veículo diz receber on-line, constroem uma narrativa focada em um objetivo: o de esperar a Prefeitura posicionar-se. Nossa observação, portanto, é sobre o uso das imagens das crianças para falar de um assunto político.

Outra análise que propomos é sobre a matéria cujo título é “Irmãos são presos por assaltar mercearia”, da Edição 787, do mês de abril de 2011. A matéria consta de uma pequena nota comentando a captura de dois irmãos, um de 15 e outro de 16 anos, presos pela Polícia Militar em Mariana, após invadirem uma mercearia em um bairro na cidade. Acompanhados de um colega, também menor de idade, os menores foram encaminhados à Delegacia de Polícia Civil para passarem pelas providências adequadas. As informações da nota que consta no Jornal Ponto Final são oriundas de um Boletim de Ocorrência. Detalhes como o valor roubado, o carro no qual os adolescentes estavam e as agressões cometidas pelos jovens são relatadas na nota. Isso chama a atenção do leitor para a banalização da atitude dos menores. O uso das fontes transmite credibilidade, tendo em vista que o poder público se fez presente na matéria com a representação dos militares. Não houve veiculação dos nomes dos adolescentes, nem utilização de fotos. Acreditamos que essa nota pode ser destacada pela riqueza nos detalhes sobre a ação criminosa e pela não exposição dos acusados. Porém, o título que propõe que dois dos três jovens são irmãos pode ajudar o leitor a descobrir quem são os personagens da história, caso esse leitor seja morador da cidade, bairro e/ou região na qual se sucedeu o ocorrido. Dessa forma, pensamos na real necessidade de comentar o grau de parentesco entre os personagens. Houve a autorização dos pais dos menores para citar esse aspecto? Será que o veículo simplesmente divulgou o fato dos infratores serem irmãos sem a preocupação da possível exposição da imagem deles, por eles terem cometido um crime? Nossa análise se permeia através dessas dúvidas que estão embutidas na palavra “irmãos” contida no título. A ANDI diz que estigmatizar demais a matéria pode dar pistas ao leitor sobre quem é o personagem, e acabar expondo a criança ou o adolescente. Seria essa uma tática do veículo ao usar o substantivo “irmãos”? A matéria ocupa um pequeno espaço no interior do Jornal, na página sete, no canto superior direito.

A matéria “Taxista é assaltado por menor em Passagem de Mariana”, foi publicada na edição do dia 1º de julho de 2011, e divulgou um crime acontecido no distrito. O taxista foi abordado pela dupla de infratores, que entrou no táxi e seguiu de Mariana até Passagem, onde pediram ao taxista que parasse o carro, pois o assalto estava acontecendo. Depois do taxista conseguir socorro, as providências junto à Polícia Militar foram tomadas. Nossa análise na matéria é sobre a forma como o jornal se refere aos infratores. Eles? Um rapaz de 21 anos, cujo nome foi explicitamente mencionado (Fagner Claudino Damas dos Santos) e um adolescente de 14 anos. No Guia, a ANDI orienta o jornalista a não usar o termo “menor”. Como percebemos essa palavra soa com um tom bastante polêmico e que expõe a imagem do jovem. Como critério básico de construção ética de uma matéria, o uso dessa palavra deve ser reprimido. Além de mencionar o adolescente de 14 anos como “menor” no decorrer da matéria, o jornalista colocou o termo no título dela também e ainda deixou de citar a presença do outro jovem no título. Isso demonstra uma perspicácia por parte do jornalista em querer chamar a atenção do leitor para o assunto, que só descobre que a ação não foi feita somente por um garoto de 14 anos, ao ler toda a matéria. A notícia é superficial e o leitor não tem informações completas. O conteúdo se localiza na página nove da edição e ocupa um bom espaço na disposição dos demais itens da página.

Na Edição 794, do mês de maio de 2011, analisamos a matéria sobre apreensão de drogas com adolescentes. O título da matéria é “Menores são apreendidos com droga no Jardim” e a página na qual a matéria está localizada é a sete. A fonte utilizada na matéria evidencia que o conteúdo foi extraído de um boletim de ocorrência da Polícia Militar de Mariana. Os jovens de 16 anos apreendidos com substâncias semelhantes à cocaína, não tiveram voz na matéria. A publicação não contém fotos e nesse sentido, está de acordo com o “Estatuto da Criança e do Adolescente – um guia para jornalistas”. Salientamos a ausência de fotos, como sendo uma característica positiva de acordo com os pilares da ANDI. Outro detalhe que percebemos ao analisar o texto foi o uso do termo “menores”. Isso acontece tanto no título, quanto no decorrer da matéria, e entendemos que o substantivo poderia ter sido trocado por algum sinônimo.

Já na edição de número 821, em novembro de 2011, analisamos a matéria “Cursinho pré-vestibular gratuito é promessa da Secretaria de Educação”. A matéria aborda uma reunião entre o secretário de educação, Rinaldo Urzedo, com o vereador Juliano Duarte, em que eles pautaram a criação de um curso pré-vestibular para os jovens da cidade. Durante a matéria, foram exemplificados também os objetivos do curso. Observamos que a notícia recorreu apenas a Juliano Duarte e Rinaldo Urzedo como fontes e focou somente no interesse deles no projeto. Como a matéria é de interesse público, o jornalista poderia ter entrevistado os próprios jovens, que são o alvo dessa notícia, ou até mesmo os pais que apoiam o projeto. É importante que durante a construção de uma matéria, o jornalista saiba ouvir todos os lados do assunto abordado, o que não é o caso da reportagem analisada.

Outra matéria analisada foi da edição 807, cujo título é “Meia-entrada não é respeitada em Mariana”. A notícia aborda algumas leis de diretrizes e bases da educação nacional, mas afirma que na cidade os jovens não estão sendo beneficiados pela lei da meia entrada. De acordo com a matéria, a redação do jornal recebeu denúncias de que essa lei não está sendo cumprida em certos estabelecimentos. O lado positivo dessa reportagem é que informa aos jovens seus direitos segundo a lei. Mas peca ao deixar de entrevistar fontes que possam embasar as informações fornecidas. Nesse caso, poderia ser um advogado, os donos das empresas ou os próprios estudantes, que não estão tendo seus direitos respeitados. Acreditamos que poderia haver uma melhor apuração dos fatos, até para obter uma pluralidade de vozes na matéria, dando mais credibilidade à notícia.

Nossa última análise foi da edição 828 do jornal, e que tem como destaque um jovem na matéria. “Aluno marianense é premiado em concurso de redação da ALMG” é o título da notícia, que abordou o prêmio que o aluno da Escola Estadual Dom Silvério, Patrick Matheus Rodrigues, recebeu da Assembleia Legislativa de Minas Gerais. O estudante foi entrevistado pela redação do jornal e contou como foi a preparação para o concurso. De acordo com o Guia, a imprensa pode desempenhar um importante papel na implementação do tema “Infância e Juventude”. E a entrevista do Jornal Ponto Final foi relevante nesse aspecto, podendo incentivar outros jovens para a leitura, por exemplo. Para destacar a premiação do aluno, o veículo optou por ceder um terço da página para a entrevista com o jovem, o que mostra o interesse do jornal em abordar o tema. Por fim, observamos a utilização positiva da foto do garoto, que ilustra a entrevista, pois ajuda o leitor, principalmente, a conhecer o estudante.

Conclusão

A partir dos três pilares propostos pelo livro “Estatuto da Criança e do Adolescente – um guia para jornalistas”, que o grupo utilizou para sua análise, pode-se concluir que as edições analisadas do Jornal Ponto Final, oscilam em seus enquadramentos. Observamos que o veículo trata de maneira tranquila a temática da “Infância e Juventude”, apesar de pecar em alguns aspectos como, o uso de imagem de crianças de forma inadequada e a perceptível ausência de fontes em algumas matérias.

Percebemos que boa parte do conteúdo abordado nas páginas do veículo são oriundos de releases e/ou documentos como Boletins de Ocorrência que serviam para fomentar as matérias.

Em contrapartida desenvolvemos a análise de algumas matérias, nas quais a abordagem do tema foi muito bem estruturada. Como exemplo, citamos a matéria que comenta a vitória de um estudante em um concurso de redações. Além de estimular o leitor infanto-juvenil à educação, o jornalista ainda utilizou da foto do personagem principal da matéria para ilustrá-la. Isso aproxima o leitor daquilo que está sendo transmitido na notícia.

Sugerimos que o jornal defina um melhor enquadramento em suas matérias relacionadas a esse tema. Percebemos que seria interessante que o veículo concedesse um espaço maior ao público infanto-juvenil em matérias relacionadas a ele, tendo em vista que boa parte das notícias fazia uso da imagem de crianças e adolescentes, mas sem sequer mencionar o que os garotos pensam a respeito.

Acreditamos que o profissional da comunicação deve fazer da publicação da ANDI, uma ferramenta crucial para o desenvolvimento de matérias que se encaixem nos princípios da Agência que é referência no diálogo profissional e ético entre as redações jornalísticas.

Categories: Destaque

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