A resposta dos líderes políticos não pode calar o sentimento de participação

Gerliani Mendes

A percepção de manifestações em cidades no interior foi comentada pela jornalista e professora Hila Rodrigues. Cientista social pela PUC Minas, vencedora dos prêmios Esso de 2001 e Líbero Badaró por sua atuação na editoria de política, Hila Rodrigues é atualmente professora do curso de Jornalismo da Universidade Federal de Ouro Preto (Ufop). Suas análises sobre as fases políticas são fruto de anos de experiência de cobertura jornalística sobre o tema, o que nos deixa pensando sobre as possibilidades que a mídia não trouxe.

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Gerliani Mendes: Hila, há uma idéia de que um “Gigante acordou”, o nacionalismo das pessoas, a recusa da presença dos partidos. Comente sobre o que está acontecendo no país.

Hila Rodrigues: Existem essas nomeações que a mídia dá: vândalos, arruaceiros, manifestantes. Há uma idéia geral que a mídia esta passando desse movimento que é apartidário, cheio de bandeiras, não tem uma bandeira única, voltado para as políticas públicas. Mas honestamente não sei o que é. Falo só de impressões, que antes de qualquer outra coisa, é resultado de um esgotamento das propostas dos partidos progressistas. Não que os projetos não existam e não sejam válidos. Mas é comum o país passar por um ciclo de propostas de um determinado governo e vertente.
Nós estamos no terceiro ciclo do partido dos trabalhadores e há um esgotamento das propostas. As pessoas que estão na rua não querem o que não tem, não estão negando que houve conquistas, mas querem mais. Elas sentem a estagnação. Do ponto de vista político, estagnaram mesmo. Por exemplo o programa Bolsa-família se estendeu para milhões de famílias, mas não existe uma evolução no que foi iniciado, não houve aprofundamento nas discussões.
Os movimentos me parecem, então, uma reação à estagnação de uma proposta. Deste ponto de vista é excelente, né? – Tanto que a Reforma Política está em vias de ser, não diria viabilizada, mas rediscutida na perspectiva de um plebiscito, ou seja, é uma proposta de ação e não debate.

GM: Você considera isto reverberação do Governo Lula ter assumido a Copa do Mundo?
HR: Eu acho que uma coisa arrefeceu a outra. Honestamente, não vejo relação direta entre a tarifa e a copa, ou entre casamento gay e a copa. Mas se é um não a corrupção, é um sim a boa utilização do recurso. Se é um não ao aumento da tarifa, pois se sobe muito nós não podemos ir e vir, então é um sim para não gastar com a copa e sim com transporte. Essa é a relação que eu vejo. Quando o Lula assumiu a Copa, estas coisas não estavam em jogo, pelo menos na perspectiva do governo.

GM: E numa cidade pequena como Mariana, que tem um perfil político muito próprio, como você avalia a população nas ruas?

HR: Acho formidável. Estes movimentos que ficam pipocando nas grandes cidades e caem no interior tem um efeito maior, porque o interior é meio que um “mundinho”, não no sentido pejorativo. Digo um “mundinho”, porque as coisas estão muito atreladas, as pessoas estão sempre em contato e acabam por se acostumar com as coisas. Em um lugar pequeno, existe um acesso limitado à recursos públicos, no sentido de ir lá e demandar, entende? – Algumas coisas estão no esfera da prefeitura, mas a maioria se resolve com o Estado. Por exemplo o SUS (Sistema Único de Saúde), o “pega-pra capá” do SUS, se resolve na União, o município precisa ficar se adequando a rede. Como não há esse acesso, as cidades interioranas recuam. Para algumas pessoas parece que esta cidade se conforma mas ela sente que não pode.
Fiquei surpresa e satisfeita quando vi aquele tanto de morador na rua. A presença das várias bandeiras pode dar a sensação de que está desfocado. Podem pensar: “Ah, mas tinha gente lá que nem sabia porque tava gritando”. Mas isso é bom! É como comer chocolate pela primeira vez, o fato de você ter saído na rua. Tinha muito pré adolescente que a rigor, não saberia o que estava fazendo, mas isso é extremamente importante para eles. É um aprendizado político ir para a rua bradar, e deixe que ele fale bobagem porque ele tem que falar alguma coisa para ir formando sua opinião política. É uma ação que inspira.
O movimento no interior renova as forças, acaba com a sensação de que não adianta buscar soluções porque estamos muito longe do Governo Estadual e da União. Juntos, na rua, todo mundo é gigante. Eu devo e posso ir pra rua. Em Mariana, que tem uma história de mudanças sucessivas na prefeitura, isso fica mais gostoso, ir e falar. Deve ter um gosto de “eu queria ter feito isto antes”
Existem coisas acontecendo nos microuniversos de cada cidadão, dentro desse universo grande. Percebemos isto com os cartazes específicos, que falam de um lugar, fazendo com que as pessoas comecem a olhar para as próprias demandas e passem a olhar pro outro também.

GM: O que você acha dessa mistura de demandas políticas, junto com o apartidarismo e esse consumo do nacionalismo com o uso de bandeiras, hinos, cara pintada, camisa branca?

HR: Eu não tenho muita certeza se é nacionalismo. Partindo da ideia de que nacionalismo privilegia os elementos do seu país, que é quando algo do seu país é mais importante do que do exterior, e que eu vou consumir e fazer as coisas daqui e não de fora, não acho que seja nacionalismo. Não sei o que é. Creio que seja um sentimento de inclusão no país, sentimento de cidadania no estilo: “Eu vou dar pitaco nas decisões do meu país”.
É mais do que nacionalismo o que move estas manifestações. “Eu sou desse país, ele tem que olhar pra mim!”. Se fosse nacionalismo, não tinha depredação. Posso estar com o viés dos anos do governos do presidente Juscelino Kubitschek, daquele ufanismo ou do “Brasil ame-o ou deixe-o”, isso que eu vejo como nacionalismo.
Este sentimento é, a meu ver o: “eu posso e quero mudar estas coisas. Não aceito mais do jeito que está”. Tanto que o discurso da presidente era este: “Eu estou ouvindo as ruas”. Mas não bastou. Ela teve que mostrar mais ação com a proposta do plebiscito.

GM: O prefeito de Mariana, Celso Cotta, propôs reduzir 0,15 centavos da passagem, passando de R$ 2,30 para R$ 2,15 e mais linhas de ônibus, o que segundo ele resultaria em no máximo três passageiros em pé. Você pode comentar essa negociação?

HR: Não tenho conhecimento da situação do transporte para saber se é uma boa proposta. Mas é bom ele achar que tem que fazer alguma coisa, porque ele podia ignorar e dizer “e daí”. A maioria das cidades em manifesto não ignorou, esse fato é positivo. Se vai ser suficiente para o que o município necessita, só a experiência vai mostrar. Não saberia ser mais pragmática, se é bom para os cidadãos ou se é apenas “falatório”. Responder é bom.
A resposta dele não pode calar o sentimento de participação. A população não pode parar caso seja ruim, tem que voltar pras ruas, assistir sessões na câmara, mobilizar vereadores e solicitar a mudança. Não pode retroceder aquela sensação antiga de “eu não posso”. A tendência nas cidades, principalmente no interior é o prefeito diz algo e o movimento toma isso como uma resolução de um problema, mas não resolve. Então precisamos manter o sentimento adquirido de que o cidadão, pode e deve cobrar.

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